Blog-notas de ideias soltas; post-it público de observações casuais; fragmentos em roda livre, fixados em âmbar. Eu, sem filtro. jorge.mourinha@gmail.com
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30 de junho de 2006
SALÃO PAIS
Já sou cliente do meu barbeiro há tanto tempo, e já estou tão habituado às idiossincrasias típicas do barbeiro de bairro, que ainda me pergunto porque é que me surpreende quando ele interrompe o corte de cabelo sem pedir desculpa para ir à porta perguntar alguma coisa a um amigo que passa de carro.
29 de junho de 2006
FORMA E FUNÇÃO (PÚBLICA)
Soube hoje pelo noticiário da televisão que as escrituras públicas deixam de ser obrigatórias para as empresas dentro de uma procura de redução da burocracia. Os empresários acham muito bem. Os notários acham muito mal, o que não só é compreensível como perfeitamente legítimo porque vão ter menos trabalho. No entanto, o porta-voz dos notários tentou mascarar o desacordo da classe com esta medida por trás de um discurso curiosamente emproado segundo o qual os empresários continuariam a preferir ter um documento validando legal e juridicamente a constituição de uma empresa, mesmo que ele já não seja obrigatório.
28 de junho de 2006
SERVIÇOS PÚBLICOS
Desde miúdo que me habituei a funcionar com gás de garrafa: em casa dos meus pais sempre tivemos gás de garrafa, com o resultado prático de que geralmente era quando eu estava no banho que o súbito enregelamento da água informava que o gás tinha acabado e era preciso substituir a garrafa.
Pensei que esses tempos teriam ficado para trás quando finalmente me mudei e a minha primeira casa alugada tinha gás de cidade. Quando me mudei para a minha actual casa, mantive o gás canalizado — até ao momento em que uma misteriosa fuga descoberta pela Lisboagás mas cuja localização nunca foi verdadeiramente encontrada os levou a cortar o fornecimento. O senhorio pesou bem as coisas e decidiu-se a instalar gás de garrafa em minha casa, em alternativa a um período prolongado de obras que implicaria deitar abaixo e reconstruir totalmente a cozinha, o que não o motivava sobremaneira (nem a mim, diga-se em abono da verdade).
O gás de garrafa continua a ter tendência para acabar quando estou no banho. Mas dá muito jeito em dias como o de hoje, em que, devido a obras de substituição das condutas realizadas pela Lisboagás, o meu prédio tem o gás cortado, situação que só deverá ser regularizada amanhã à tarde. Envio daqui um abraço de solidariedade aos infelizes da Barjona de Freitas que a Lisboagás deixou sem gás já há uns largos dias e não há maneira de resolver.
Pensei que esses tempos teriam ficado para trás quando finalmente me mudei e a minha primeira casa alugada tinha gás de cidade. Quando me mudei para a minha actual casa, mantive o gás canalizado — até ao momento em que uma misteriosa fuga descoberta pela Lisboagás mas cuja localização nunca foi verdadeiramente encontrada os levou a cortar o fornecimento. O senhorio pesou bem as coisas e decidiu-se a instalar gás de garrafa em minha casa, em alternativa a um período prolongado de obras que implicaria deitar abaixo e reconstruir totalmente a cozinha, o que não o motivava sobremaneira (nem a mim, diga-se em abono da verdade).
O gás de garrafa continua a ter tendência para acabar quando estou no banho. Mas dá muito jeito em dias como o de hoje, em que, devido a obras de substituição das condutas realizadas pela Lisboagás, o meu prédio tem o gás cortado, situação que só deverá ser regularizada amanhã à tarde. Envio daqui um abraço de solidariedade aos infelizes da Barjona de Freitas que a Lisboagás deixou sem gás já há uns largos dias e não há maneira de resolver.
27 de junho de 2006
PORTUGAL PORTUGAL PORTUGAL
Quem quisesse ontem saber efectivamente notícias do país e do mundo no noticiário das 20h00 da RTP-1 teve de esperar precisamente 32 minutos: 19 dedicados à gloriosa vitória lusa sobre as hordes holandesas, à arbitragem, aos casos do jogo, ao que os outros acharam do jogo e ao dia de folga do próximo adversário; 8 minutos de intervalo preenchidos por anúncios; e 4 dedicados ao jogo Itália-Austrália. 26 minutos depois, o noticiário estava terminado, para dar lugar a António Vitorino e Judite de Sousa, e não se falou das propostas da Ministra da Cultura.
26 de junho de 2006
O MARAVILHOSO MUNDO DA ESTRADA DE BENFICA
Letreiro luminoso de um sapateiro: "Super-Rápido de Sete Rios — concerto de solas e sapatos".
Graffiti lido junto ao restaurante Coral: "Pena de morte já para os ladrões!".
Graffiti lido alguns metros mais à frente, na mesma letra: "O ar condicionado mata as pessoas".
Cartão escrito em maiúsculas numa loja de colchões: "Osteoporose? Visco-elástico!"
Graffiti lido junto ao restaurante Coral: "Pena de morte já para os ladrões!".
Graffiti lido alguns metros mais à frente, na mesma letra: "O ar condicionado mata as pessoas".
Cartão escrito em maiúsculas numa loja de colchões: "Osteoporose? Visco-elástico!"
25 de junho de 2006
AND EACH TIME I GO TO BED I PRAY LIKE ARETHA FRANKLIN
Ainda não ouvi o disco novo, mas a existência de um quinto álbum de estúdio do projecto de Paul Strohmeyer aka Green Gartside, isto é, dos Scritti Politti, levou-me a repescar dois dos meus discos favoritos de todo o sempre, dois dos mais extraordinários álbuns pop que me passaram pelos ouvidos — e perceber que ainda o continuam a ser. Um recorda-me dos meus tempos de liceu e das descobertas que eu fazia no "Som da Frente" do António Sérgio no horário das quatro da tarde, o outro dos meus primeiros tempos a trabalhar na EMI, em "part-time" por entre o segundo ano da faculdade.
"Cupid & Psyche '85" (Virgin, 1985) e "Provision" (Virgin, 1988) são dois monumentos ao hedonismo inteligente, alma soul e enlevo pop capturados dentro da tecnologia polida e precisa da electrónica asséptica, uma espécie de "blue-eyed soul" carregada de subtextos semióticos, paradoxo apropriado a uma década de forma antes de função, fachada em vez de substância (uma das canções de "Provision" chamava-se até "Philosophy Now"), numa desconstrução subversiva e doce das regras e códigos da canção pop que nunca saía das suas fronteiras. "Cupid & Psyche '85" é a exposição, "Provision" o desenvolvimento (ou, se quisermos, a expansão do orçamento para a super-produção, mantendo intocável a capacidade de fazer de uma letra abstracta um lúdico jogo de palavras sobre o amor perfeitamente encaixado numa melodia contagiante). E, sendo dois álbuns absolutamente do seu tempo, cápsulas perfeitas de uma era que já não volta, sobreviveram-lhe com uma ingenuidade desarmante que chega a surpreender.
Mas Simon Reynolds explica tudo muito melhor do que eu.
"Cupid & Psyche '85" (Virgin, 1985) e "Provision" (Virgin, 1988) são dois monumentos ao hedonismo inteligente, alma soul e enlevo pop capturados dentro da tecnologia polida e precisa da electrónica asséptica, uma espécie de "blue-eyed soul" carregada de subtextos semióticos, paradoxo apropriado a uma década de forma antes de função, fachada em vez de substância (uma das canções de "Provision" chamava-se até "Philosophy Now"), numa desconstrução subversiva e doce das regras e códigos da canção pop que nunca saía das suas fronteiras. "Cupid & Psyche '85" é a exposição, "Provision" o desenvolvimento (ou, se quisermos, a expansão do orçamento para a super-produção, mantendo intocável a capacidade de fazer de uma letra abstracta um lúdico jogo de palavras sobre o amor perfeitamente encaixado numa melodia contagiante). E, sendo dois álbuns absolutamente do seu tempo, cápsulas perfeitas de uma era que já não volta, sobreviveram-lhe com uma ingenuidade desarmante que chega a surpreender.
Mas Simon Reynolds explica tudo muito melhor do que eu.
24 de junho de 2006
22 de junho de 2006
PARIS DAY TRIP
07h55 TP432 Lisboa/Paris Orly
O aeroporto de Lisboa está cheio de grupos (muitos deles "corporate") com camisolas, cachecóis, bandeiras portuguesas, prestes a apanhar o avião para ir apoiar a selecção. Este conceito da "day trip" parece estar a ganhar apoiantes. O vôo para Paris sai, contudo, com cerca de 20 minutos de atraso, explicados de modo pouco convincente pelo comandante com atraso no carregamento das malas e um pequeno problema técnico já resolvido. À chegada a Paris, o tempo está encoberto.
13h00-15h45 Marais
Chuvisca quando o táxi nos deixa no Marais. Decidimos almoçar perto da zona das entrevistas: escolhemos um "bistro" de esplanada na Rue Garon, debaixo de um toldo. Um delicioso pato confitado com batatas salteadas e salada de alface e rúcula com um vinagrete muito suave. Quando visito a casa de banho, fico surpreendido com a acanhada cozinha.
Já perto do fim da refeição, sentam-se na mesa do lado duas trintonas elegantes, com ar de mulheres de negócios do mundo da moda, acompanhadas por um trintão igualmente elegante, com ar dubitativamente bissexual, todos vestidos de preto justo. Ele pede só um café, elas bebem coca-cola e pedem sanduíches. Uma delas, loura, longos cabelos, mala de mão multicor ao colo, passa o almoço todo a falar ao telemóvel em italiano enquanto come a sanduíche de garfo e faca, e só quando no prato apenas resta um pouco de salada e uma ponta de pão torrado pousa o telemóvel.
16h00-18h00 Centre Pompidou, Le Centre Halles Café, Les Halles
Beaubourg (o nome comum do museu de arte moderna que é o Centre Pompidou) é um labirinto, um emaranhado de galerias dentro de uma estrutura que parece um emaranhado temporário e exposto de tubos e armações metálicas. Subimos as escadas rolantes exteriores pelos tubos laterais translúcidos que, do sexto andar, nos deixam ver a cidade em toda a sua magnificência tradicional, mesmo num dia cinzento e encoberto como este, com a Torre Eiffel a dominar a paisagem à esquerda.
Nas ruas, toda a gente parece estar a passear depois do almoço, tal o movimento nesta tarde de quarta-feira, dia da Fête de la Musique espalhada por toda a cidade.
19h20-20h00 RER linha B3 Châtelet Les Halles-Roissy Charles de Gaulle 1
De regresso ao aeroporto (mas não o mesmo de onde partimos), tomamos o comboio suburbano para Roissy — oito euros o bilhete, apanhamos um comboio quase imediatamente, e o João Miguel aponta correctamente que, assim que saímos da segunda estação ainda parisiense, Paris Nord, contam-se pelos dedos os passageiros de etnia branca no comboio, que se vai esvaziando lentamente nas estações suburbanas de Aulnay-sous-Bois e Sevran/Beaudottes. Uma vez saídos desta última, feia e subterrânea, o comboio viaja por entre bosques imaculadamente verdes até regressar ao subterrâneo em Roissy Charles de Gaulle.
20h00-21h45 Roissy Charles de Gaulle Satellite 6
21h45 TP429 Roissy Charles de Gaulle/Lisboa
A empregada do check-in da TAP é uma volumosa senhora negra simpatiquíssima que nos senta na traseira do avião em coxias contíguas, permitindo-nos assim viajar afastados do enorme grupo de pais e crianças que regressam de uma excursão-rodarte à Disneylândia de Paris, visível pelos lenços de pirata que alguns pais usam à cabeça por cima de T-shirts justas que deixam ver as barrigas de cerveja, pelas maquilhagens de princesa usadas por algumas meninas, pelos inúmeros sacos de plástico Disneyland Resort Paris que parecem proliferar, pelas orelhas, bonés e T-shirts do rato Mickey. A aterragem é um bocado camioneta-de-carreira-na-estrada-da-Malveira devido ao vento que se faz sentir lá fora.
O aeroporto de Lisboa está cheio de grupos (muitos deles "corporate") com camisolas, cachecóis, bandeiras portuguesas, prestes a apanhar o avião para ir apoiar a selecção. Este conceito da "day trip" parece estar a ganhar apoiantes. O vôo para Paris sai, contudo, com cerca de 20 minutos de atraso, explicados de modo pouco convincente pelo comandante com atraso no carregamento das malas e um pequeno problema técnico já resolvido. À chegada a Paris, o tempo está encoberto.
13h00-15h45 Marais
Chuvisca quando o táxi nos deixa no Marais. Decidimos almoçar perto da zona das entrevistas: escolhemos um "bistro" de esplanada na Rue Garon, debaixo de um toldo. Um delicioso pato confitado com batatas salteadas e salada de alface e rúcula com um vinagrete muito suave. Quando visito a casa de banho, fico surpreendido com a acanhada cozinha.
Já perto do fim da refeição, sentam-se na mesa do lado duas trintonas elegantes, com ar de mulheres de negócios do mundo da moda, acompanhadas por um trintão igualmente elegante, com ar dubitativamente bissexual, todos vestidos de preto justo. Ele pede só um café, elas bebem coca-cola e pedem sanduíches. Uma delas, loura, longos cabelos, mala de mão multicor ao colo, passa o almoço todo a falar ao telemóvel em italiano enquanto come a sanduíche de garfo e faca, e só quando no prato apenas resta um pouco de salada e uma ponta de pão torrado pousa o telemóvel.
16h00-18h00 Centre Pompidou, Le Centre Halles Café, Les Halles
Beaubourg (o nome comum do museu de arte moderna que é o Centre Pompidou) é um labirinto, um emaranhado de galerias dentro de uma estrutura que parece um emaranhado temporário e exposto de tubos e armações metálicas. Subimos as escadas rolantes exteriores pelos tubos laterais translúcidos que, do sexto andar, nos deixam ver a cidade em toda a sua magnificência tradicional, mesmo num dia cinzento e encoberto como este, com a Torre Eiffel a dominar a paisagem à esquerda.
Nas ruas, toda a gente parece estar a passear depois do almoço, tal o movimento nesta tarde de quarta-feira, dia da Fête de la Musique espalhada por toda a cidade.
19h20-20h00 RER linha B3 Châtelet Les Halles-Roissy Charles de Gaulle 1
De regresso ao aeroporto (mas não o mesmo de onde partimos), tomamos o comboio suburbano para Roissy — oito euros o bilhete, apanhamos um comboio quase imediatamente, e o João Miguel aponta correctamente que, assim que saímos da segunda estação ainda parisiense, Paris Nord, contam-se pelos dedos os passageiros de etnia branca no comboio, que se vai esvaziando lentamente nas estações suburbanas de Aulnay-sous-Bois e Sevran/Beaudottes. Uma vez saídos desta última, feia e subterrânea, o comboio viaja por entre bosques imaculadamente verdes até regressar ao subterrâneo em Roissy Charles de Gaulle.
20h00-21h45 Roissy Charles de Gaulle Satellite 6
21h45 TP429 Roissy Charles de Gaulle/Lisboa
A empregada do check-in da TAP é uma volumosa senhora negra simpatiquíssima que nos senta na traseira do avião em coxias contíguas, permitindo-nos assim viajar afastados do enorme grupo de pais e crianças que regressam de uma excursão-rodarte à Disneylândia de Paris, visível pelos lenços de pirata que alguns pais usam à cabeça por cima de T-shirts justas que deixam ver as barrigas de cerveja, pelas maquilhagens de princesa usadas por algumas meninas, pelos inúmeros sacos de plástico Disneyland Resort Paris que parecem proliferar, pelas orelhas, bonés e T-shirts do rato Mickey. A aterragem é um bocado camioneta-de-carreira-na-estrada-da-Malveira devido ao vento que se faz sentir lá fora.
21 de junho de 2006
PARIS DAY TRIP (prelúdio/resumo)
07h55 TP432 Lisboa/Paris Orly 13h00-15h45Marais, Café Bar Rue Garon, entrevistas 16h00-18h00 Centre Georges Pompidou, Le Centre Halles Café, Les Halles 18h00-19h15 Fnac Forum les Halles 19h20-20h00 RER linha B3 Châtelet-Les Halles/Roissy Charles de Gaulle 21h45 TP429 Paris Charles de Gaulle/Lisboa
(e porque será que sempre que há uma criança birrenta a fazer fitas num aeroporto é sempre uma criança portuguesa?)
(desenvolvimentos no próximo post)
(e porque será que sempre que há uma criança birrenta a fazer fitas num aeroporto é sempre uma criança portuguesa?)
(desenvolvimentos no próximo post)
20 de junho de 2006
CONVENTO SEM AÇÚCAR
Reportagem, ontem, no telejornal da RTP-1, sobre os exames nacionais, com a repórter a perguntar a uma roda de estudantes se tinham lido o romance que fazia parte do currículo e que iria sair no exame, "Memorial do Convento" de José Saramago. Todos disseram, sem excepção, que não o tinham lido, e que se tinham preparado para o exame com os "resumos". Fiquei perplexo e escandalizado pelo ar divertido, tão tipicamente adolescente "sim-eu-sei-que-não-fiz-o-que-devia-mas-sou-tão-giro-tão-queriducho-que-vocês-me-vão-desculpar-com-certeza" com que eles assumiam que não tinham lido o livro.
Claro que, depois, me lembrei da seca que foi ter de ler as "Viagens na Minha Terra" do Almeida Garrett no liceu e "A Sibila" da Agustina Bessa-Luís no 12º ano. Mas pelo menos li (mesmo que a muito custo, é verdade; e nem cheguei a comprar "A Sibila", li-o emprestado por uma colega, e achei uma seca tão transcendente que fiquei irremediavelmente vacinado contra a escrita de Agustina, embora me pareça normal que um puto de 18 anos que está virado para outras coisas não fique entusiasmado com a Agustina a não ser que o/a professor/a consigam dar a entender como a Agustina é boa, o que não foi o caso). Ou seja, há uma parte de mim que os compreende, porque naquela idade há coisas que não se abrangem, mas há outra que não percebe como é possível baldar-se desta maneira a coisas que não são tão irrelevantes como podem parecer à mente de um teenager inconsciente. Claro que o Saramago ao pé dos "Morangos com Açúcar" não é ninguém.
Claro que, depois, me lembrei da seca que foi ter de ler as "Viagens na Minha Terra" do Almeida Garrett no liceu e "A Sibila" da Agustina Bessa-Luís no 12º ano. Mas pelo menos li (mesmo que a muito custo, é verdade; e nem cheguei a comprar "A Sibila", li-o emprestado por uma colega, e achei uma seca tão transcendente que fiquei irremediavelmente vacinado contra a escrita de Agustina, embora me pareça normal que um puto de 18 anos que está virado para outras coisas não fique entusiasmado com a Agustina a não ser que o/a professor/a consigam dar a entender como a Agustina é boa, o que não foi o caso). Ou seja, há uma parte de mim que os compreende, porque naquela idade há coisas que não se abrangem, mas há outra que não percebe como é possível baldar-se desta maneira a coisas que não são tão irrelevantes como podem parecer à mente de um teenager inconsciente. Claro que o Saramago ao pé dos "Morangos com Açúcar" não é ninguém.
19 de junho de 2006
FLASH POLAROID
O polícia desce as escadas do Colombo olhando para dentro do saco da Worten que traz na mão.
18 de junho de 2006
FUNDAMENTAL, ACTUALLY.
O Jorge Lopes já tinha avisado (aqui, e em Dezembro!), e o Jorge é um rapaz atento e de bom gosto, mas eu estava com uma certa relutância em acreditar que pudesse ser possível, depois do descalabro de "Release" e apesar dos bons resultados do "Battleship Potemkin". Depois, é o meu guru Andrew Sullivan que, pelo meio dos seus posts sociopolíticos a propósito desse país estranho e magnífico que é a América, tem andado a fazer campanha pela absoluta genialidade do objecto (o último exemplo da coisa está aqui). Agora que já ouvi, acho que é da mais elementar justiça confirmar que, sim, "Fundamental" é um magnífico regresso à melhor forma dos Pet Shop Boys e gostava de acreditar que a culpa não é só de Trevor Horn (ele dos Frankie Goes To Hollywood e ABC). Diga-se, já agora, que não há em "Fundamental" nenhum "Left to My Own Devices" (a odisseia surrealista tecno-disco que Horn produziu a Neil Tennant e Chris Lowe no "Introspective" de 1988), mas há três ou quatro momentos que chegam muito perto ("The Sodom and Gomorrah Show" anyone? ou mesmo o vergonhoso tecno-disco-xunga-New-Orderiano "Minimal"?).
O que é verdadeiramente extraordinário em "Fundamental" é que este é um grande álbum de pop política: os Pet Shop Boys dedicam-no a dois jovens iranianos condenados à morte por assumirem a sua homossexualidade; em "I'm with Stupid" lançam uma diatribe corrosiva à relação George W. Bush/Tony Blair que não fica atrás do "Shoot the Dog" de George Michael; "Integral" é uma ameaçadora meditação sobre o totalitarismo escondido por trás da limitação das liberdades que faz pensar em "V de Vingança". E depois há "Luna Park", sobre o alheamento mediático do mundo lá fora, que resume na perfeição o que é "Fundamental", nas palavras imediatas de Prince: "two thousand zero zero party over oops out of time/ tonight I'm gonna party like it's 1999". A festa de arromba antes do apocalipse.
E tudo isto ao som de alguma da pop descartável mais inspirada da carreira dos Pet Shop Boys. "Fundamental" é fundamental. E, sim, é um dos discos do ano.
17 de junho de 2006
CONVÉM SEMPRE TER UMA PEQUENA DESCULPA PREPARADA
...para o caso de se ser apanhado no supermercado com a braguilha das calças aberta. "Ah, o fecho abre sozinho".
(Por acaso é verdade, o fecho tem tendência a abrir-se sozinho. No caso vertente, contudo, apanhei a distracção antes de alguém reparar.)
(Por acaso é verdade, o fecho tem tendência a abrir-se sozinho. No caso vertente, contudo, apanhei a distracção antes de alguém reparar.)
16 de junho de 2006
AFIRMAÇÃO POTENCIALMENTE INQUESTIONÁVEL (note to self)
Quando você lê o que escrevo, note bem isto, nunca o esqueça, a vida é uma linguagem, a escrita uma outra bem diferente. As gramáticas duma e doutra não são intermutáveis.
— Louis Aragon, in Tratado do Estilo (1928), traduzido por Júlio Henriques (Lisboa: Antígona, 1995)
— Louis Aragon, in Tratado do Estilo (1928), traduzido por Júlio Henriques (Lisboa: Antígona, 1995)
15 de junho de 2006
POST DE DEVOÇÃO INCONDICIONAL
...à divina voz da Petra, que é nossa, muito nossa e de mais ninguém e canta os blues como ninguém em Portugal o faz. Ainda por cima, não precisam de pagar nada para a ouvir cantar: façam o favor de ir aqui e, descendo pela página abaixo, procurem por Nobody's Bizness - Ao Vivo na Capela da Misericórdia Sines 2005 e descarreguem, totalmente gratuitamente, o "Full Album". Não garanto que a vossa vida mude, mas ficará certamente abrilhantada.
Em alternativa, podem ir aqui saber mais sobre a Petra e os Nobody's Bizness Blues Band, ouvir um bocado de música antes de decidirem ir buscar o disco todo e saber quando é que a podem ir ouvir cantar ao vivo.
Ah, e Petra, mon petit poussin, je vous demande pardon, je n'ai pas remarqué votre joyeux anniversaire et je n'ai toujours pas écouté le disque de Paul Simon que notre petit JB trouve assez chiant. Je vous embrasse très fort, mon petit poussin, et j'écoute toujours notre Ry Cooder.
Em alternativa, podem ir aqui saber mais sobre a Petra e os Nobody's Bizness Blues Band, ouvir um bocado de música antes de decidirem ir buscar o disco todo e saber quando é que a podem ir ouvir cantar ao vivo.
Ah, e Petra, mon petit poussin, je vous demande pardon, je n'ai pas remarqué votre joyeux anniversaire et je n'ai toujours pas écouté le disque de Paul Simon que notre petit JB trouve assez chiant. Je vous embrasse très fort, mon petit poussin, et j'écoute toujours notre Ry Cooder.
14 de junho de 2006
LUZ E SOMBRA
Parece que estou a dormir há várias horas, mas afinal são apenas duas e meia da manhã quando acordo meio estremunhado, o meu quarto iluminado por clarões regulares de luz branca como as estroboscópicas das discotecas, com um ribombar de tambores constante à distância. Entre as duas e meia e as três e meia da manhã, a tempestade não dá tréguas, com uma sequência de relâmpagos que iluminam o céu por cima das nuvens cinzentas e trovões que soam ininterruptamente como uma batalha que se ouve à distância. O cheiro a molhado que entra pelas janelas de persianas corridas mistura-se com um odor a fósforo queimado. E, por um instante, compreendo porque é que os antigos temiam e respeitavam as noites de tempestade.
13 de junho de 2006
O REI DAS FARTURAS
Adoro farturas. Quando era miúdo, ir à Feira Popular e trazer para casa um daqueles saquinhos de plástico com atilho forrado a papel vegetal com a referência aos "três irmãos das farturas" (azul para os pacotes de meia-dúzia, vermelho para os pacotes de uma dúzia — ou talvez fosse ao contrário) e as farturas lá dentro afogadas numa mistura de açúcar e canela era uma perdição. Aliás, mesmo já vintão, ainda em casa dos meus pais, era o delírio quando eles iam à Feira passear e me traziam um pacote de farturas.
A Feira do Livro deu-me o pretexto perfeito para comer uma fartura ontem à noite. O que só me recordou uma outra coisa: mais que adorar farturas, adoro farturas frias. Sério. Comê-las acabadas de fritar deixa-me sempre o estômago a queixar-se durante uns minutos. Eu gosto mesmo é delas já quase frias, com a consistência de pastilha elástica.
A Feira do Livro deu-me o pretexto perfeito para comer uma fartura ontem à noite. O que só me recordou uma outra coisa: mais que adorar farturas, adoro farturas frias. Sério. Comê-las acabadas de fritar deixa-me sempre o estômago a queixar-se durante uns minutos. Eu gosto mesmo é delas já quase frias, com a consistência de pastilha elástica.
12 de junho de 2006
WHAT'S IN A NAME?
Há dois nomes de ilustres "habitués" dos noticiários nocturnos que me deixam sempre com um sorriso nos lábios (os ditos cujos que me perdoem): o eminente sindicalista Bettencourt Picanço e o eminente executivo Elidérico Viegas.
11 de junho de 2006
MÚSICA PELO CAMINHO
June Tabor do Rato ao Bairro das Colónias.
Richard Thompson no eléctrico da Graça até à Estrela.
Townes van Zandt no circuito Estrela/Saldanha/Estrela.
8 de junho de 2006
AFIRMAÇÃO INQUESTIONÁVEL
É sabido que a particularidade dos génios consiste em fornecer ideias aos cretinos vinte anos mais tarde. Seria injusto mostrarmo-nos severos com o génio por causa disso.
— Louis Aragon, in Tratado do Estilo (1928), traduzido por Júlio Henriques (Lisboa: Antígona, 1995)
— Louis Aragon, in Tratado do Estilo (1928), traduzido por Júlio Henriques (Lisboa: Antígona, 1995)
7 de junho de 2006
IT'S A SMALL WORLD AFTER ALL
#1 Através do Luís, descobri este excelente post do João Lopes no blog que partilha há alguns meses com o Nuno Galopim, e no qual se tem feito raro. É um texto que partilha um sem-número das minhas próprias reflexões sobre o que significa hoje em dia ter uma opinião num universo mediático onde o conceito de "opinion-maker" já não corresponde em nada à sua significação primordial, e que subscrevo inteiramente.
#2 Através do Jorge, descubro que o Rodrigo já tem um blog próprio há largas semanas e eu não sabia. E descubro também que o António cumpriu finalmente o plano que me tinha revelado num recente encontro casual na Feira do Livro e também abriu o seu cantinho dedicado às músicas do mundo, que irá certamente começar a rapidamente a dar abadas nos outros todos porque ele é o tipo que eu conheço que mais percebe de músicas do mundo. Muito embora ele tenha em casa a caixa dos Abba e se desculpe como "material de pesquisa" quando eu sei muito bem que ele não quer é admitir que gosta mesmo dos Abba.
#2 Através do Jorge, descubro que o Rodrigo já tem um blog próprio há largas semanas e eu não sabia. E descubro também que o António cumpriu finalmente o plano que me tinha revelado num recente encontro casual na Feira do Livro e também abriu o seu cantinho dedicado às músicas do mundo, que irá certamente começar a rapidamente a dar abadas nos outros todos porque ele é o tipo que eu conheço que mais percebe de músicas do mundo. Muito embora ele tenha em casa a caixa dos Abba e se desculpe como "material de pesquisa" quando eu sei muito bem que ele não quer é admitir que gosta mesmo dos Abba.
6 de junho de 2006
CHOCOLATE ON THE ROCKS
Meia hora ficou a tablete de chocolate escondida debaixo do assento da frente do carro, ao sol, o suficiente para, quando cheguei a casa, sentir uma pasta quase líquida dentro do invólucro de plástico. Depois de um par de dias no frigorífico, não pensem contudo que a barra recuperou a sua forma original — em vez disso, temos uma construção boschiana que, sabendo exactamente ao que devia, adquiriu as formas derretidas de uma vela de cheiro usada.
5 de junho de 2006
VISTO DE FORA
É muito curioso ver Lisboa pelos olhos dos estrangeiros e perceber, por exemplo, como me diziam hoje amigos americanos de passagem para um congresso médico, que em Lisboa parece haver as obras que nas cidades deles não há, que os jardins parecem bem tratados e bem cuidados ao contrário dos deles, que há muitos cães que as pessoas tratam bem e levam a passear à rua aos jardins bem tratados. E, sobretudo, que, ao contrário deles, as pessoas na rua são tudo menos simpáticas e abertas, e são muito metidas consigo e fechadas, enquanto os americanos começam logo a falar connosco como se nos conhecessem há anos.
4 de junho de 2006
CARREIRA 28
O eléctrico está cheio; dirijo-me para a traseira, para ver se consigo um lugarzinho sossegado em pé junto à saída, mas o mais que consigo é encostar-me à janela, junto a uma senhora de meia-idade, de rosto rugoso e ressequido, vestida com uma camisola de manga cava verde alface e umas calças escuras sobre umas sandálias quadradas em sola de madeira. O cheiro desagradável que ali se sente só pode vir das suas axilas. A senhora vai resmungando para si com a quantidade de paragens que o eléctrico vai fazendo devido a sinais, carros mal estacionados, passagens de peões. Vendo o meu caderno de notas no bolso da minha camisa, decide por bem alertar-me para o perigo dos carteiristas, "até parece que andam aí uns morenos, é um instante enquanto perde a carteira, e o problema nem é o dinheiro, é mais os documentos". Agradeço-lhe pela preocupação. Quando um lugar vaga, a senhora senta-se, para logo se levantar oferecendo-o a um senhor idoso de cabelos brancos que está em pé; o senhor recusa gentilmente, mas a senhora não se levanta para oferecer o lugar quando passa uma idosa de cabelos brancos visivelmente mais velha que o senhor que recusara o lugar.
3 de junho de 2006
CARREIRA 28
Em frente à Basílica da Estrela, um casal pós-adolescente espera a chegada do eléctrico. Ele está de camisola de manga cava, boné, toalha ao ombro e calças de ganga, ela de T-shirt e saia leve, óculos escuros, com um saco de cartão na mão. Durante cinco minutos ele resmunga porque o eléctrico nunca mais chega, apesar do sinal que marca o tempo de espera pelo próximo eléctrico se manter imóvel nos 4 minutos; entre risinhos convencidos, ele elabora no momento uma pequena teoria da conspiração segundo a qual a informação está ali apenas para enganar o pacóvio que espera pelo transporte. Quando o eléctrico finalmente chega, ele diz-lhe, "bom, miúda, vou bazar" e, sem se despedir dela, vai-se embora contornando o eléctrico enquanto ela, sem olhar para ele, aguarda a sua vez de entrar.
1 de junho de 2006
CARREIRA 28
Passa pouco das cinco da tarde e, enquanto esperamos frente à Basílica da Estrela que surja o eléctrico 28 para o Martim Moniz, uma senhora idosa, de pele escura e ressequida e longo cabelo negro, vestida com uma blusa azul vivo e umas calças pretas, de sabrinas brancas muito sujas e sacos de papel na mão, anda de um lado para o outro junto à paragem do eléctrico, cuspindo regularmente para o chão enquanto murmura imperceptivelmente. Passado algum tempo, surge o 28 para Campo de Ourique, a senhora atravessa a rua e apanha o eléctrico.
Passa pouco das sete e meia da tarde e, de regresso a casa, apanho o eléctrico 28 para Campo de Ourique junto à Sé. Não há lugares sentados, e dirijo-me para a traseira do eléctrico para ficar em pé junto à saída enquanto não vaga um assento. Sentada num dos lugares está a mesma idosa de blusa azul, calças pretas e sabinas brancas, cuspindo regularmente para fora da janela. Sai na Basílica da Estrela; antes de entrar no jardim, ainda a vejo atravessar a rua em direcção à paragem do 28 no sentido Martim Moniz.
Passa pouco das sete e meia da tarde e, de regresso a casa, apanho o eléctrico 28 para Campo de Ourique junto à Sé. Não há lugares sentados, e dirijo-me para a traseira do eléctrico para ficar em pé junto à saída enquanto não vaga um assento. Sentada num dos lugares está a mesma idosa de blusa azul, calças pretas e sabinas brancas, cuspindo regularmente para fora da janela. Sai na Basílica da Estrela; antes de entrar no jardim, ainda a vejo atravessar a rua em direcção à paragem do 28 no sentido Martim Moniz.
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