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30 de setembro de 2006

PORQUE HOJE E SABADO...

...um condutor que quer arrumar o carro em frente ao Diário de Notícias resmunga, apitando e gesticulando, com o condutor do carro da frente que também quer arrumar o carro em frente ao Diário de Notícias e está à espera que um outro condutor saia para poder arrumar com mais espaço porque tem dois lugares.

...um sem-abrigo de pele encardida e cabelo desgrenhado parece dançar no meio da rua como quem gesticula para que um condutor arrume um carro naquele lugar, só que não há ali lugar nenhum para arrumar, está tudo cheio.

...um condutor faz-me um gesto obsceno com a mão esquerda quando lhe apito simpaticamente por ele estar a conduzir entre as duas faixas de rodagem na Alexandre Herculano.

29 de setembro de 2006

ONDE SE RECUPERA O ATRASO

A ausência de posts estes últimos dias não foi falta de inspiração nem de tempo, foi mesmo dedicação a outras coisas, como por exemplo jantares com amigos (as pataniscas e o arroz de pimentos da Cristina estavam divinais), gatinhos recém-nascidos (a ninhada de Gueixa von Satori está de saúde e recomenda-se), viagens de metro (Rato-Parque das Nações e volta), livros e revistas (e ainda não acabei a Economist desta semana) e muitos discos ("Cê" de Caetano Veloso é cada vez mais um álbum incontornável, "The Eraser" de Thom Yorke uma surpresa assinalável, "Antidepressant" de Lloyd Cole continua imbatível, "Amigos em Portugal" dos Durutti Column e "From Gardens Where We Feel Secure" de Virginia Astley recordações agradáveis, "Around" de Tom Verlaine uma sedução instantânea). E, claro, o inenarrável Festival da Canção Junior 2006 da RTP (não sabem o que perderam), que uma qualquer ironia cósmica pôs a antecipar o filme de Roberto Benigni "A Vida É Bela".

26 de setembro de 2006

O PRO MEU IPOD TAO ECLECTICO #6

Primeiro, o novo álbum de Lloyd Cole, "Antidepressant" (Sanctuary, 2006) — prolongando a abordagem caseirinha lo-fi do anterior "Music in a Foreign Language", mas menos suicida (apesar de "Slip Away") e bem mais irónico. É Cole "vintage", embora um disco de manutenção mais do que de inspiração — "Antidepressant", "Everysong", "I Am Not Willing" e "Travelling Light" são clássicos instantâneos que exigem o "repeat" no leitor.

Depois, para fazer contrapeso, o surpreendente álbum em colaboração de Mark Knopfler e Emmylou Harris, "All the Roadrunning" (Mercury, 2006) — em rigor, dever-se-ia dizer que é um álbum de Knopfler com a participação especial de Harris (ele é que escreveu as canções quase todas), não fosse o encaixe das duas vozes ser tão notável e as composições (quase todas do guitarrista) fugirem, felizmente e maioritariamente, ao padrão Dire Straits para estarem muito mais próximas do universo da divina Emmylou. Knopfler parece estar muito mais à vontade aqui no que nos discos em nome próprio ou com os Straits, e "Donkey Town" e "All the Roadrunning" são jóias primorosas, mas é um disco que se vai revelando com mais e mais audições. Já estou a gostar muito.

25 de setembro de 2006

THE REAL CAT POWER

Experimentem visitar amigos cuja gata acabou de dar à luz uma ninhada. Vão ser pelo menos três horas a curtir voltar a pôr os gatinhos irrequietos no berço de onde passam a vida a saltar para explorarem as redondezas.

22 de setembro de 2006

LUFA-LUFA

Há algo de profundamente irónico em ouvir a "Ode aos Ratos" de Chico Buarque enquanto mudo de linha nos átrios da estação do Marquês de Pombal à hora de ponta da manhã.

rato de rua, irrequieta criatura
tribo em frenética proliferação
lúbrico, libidinoso transeunte
boca de estômago atrás do seu quinhão

vão aos magotes a dar com um pau levando o terror
do parking ao living, do shopping center ao léu
do cano de esgoto pró topo do arranha-céu

rato de rua, aborígene do lodo
fuça gelada, couraça de sabão
quase risonho profanador de tumba
sobrevivente à chacina e à lei do cão

saqueador da metrópole, tenaz roedor
de toda esperança estuporador da ilusão
ó meu semelhante, filho de Deus, meu irmão

rato
rato que rói a roupa
que rói a rapa do rei do morro
que rói a roda do carro
que rói o carro, que rói o ferro
que rói o barro, rói o morro
rato que rói o rato
ra-rato, ra-rato
roto que ri do roto
que rói o farrapo
do esfarra-rapado
que mete a ripa, arranca rabo
rato ruim
rato que rói a rosa
rói o riso da moça
e ruma rua arriba
em sua rota de rato


— Chico Buarque, "Ode aos Ratos" (in "Carioca", Biscoito Fino 2006)

21 de setembro de 2006

É SÓ CONSTIPAÇÃO CONSTIPAÇÃO (todos os homens são maricas quando estão com gripe, mas não gostam que se saiba)

A parte mais chata é a garganta inflamada. Durante (habitualmente) 24 horas custa-me a engolir, sinto-me quente, sou suposto beber muitos líquidos mas o raio dos líquidos custam-me a engolir, sinto a garganta a arranhar e fico geralmente irritado e mal-disposto e sem vontade de falar com ninguém nem de comer, embora até vá tendo fome.

Desta vez não foram 24 horas, foram quase 48, comecei a inquietar-me se não seria o retorno da amigdalite que me atormentou no Natal passado, e pouco disposto a passar outra vez pela experiência, fui ao médico, que me disse que não era de todo amigdalite, mas que tinha a garganta bastante inflamada.

Ao final das quase 48 e de um anti-inflamatório de acção rápido, surgiu o espirro salvador que revelava a verdade: era mesmo uma constipação. Não foi um espirro, foram mesmo dois. Na manhã seguinte acordei com o nariz irredutivelmente tapado, com uma voz de meter medo ao susto e com expectoração regular. Era oficial: estava constipado.

"Pois," disse a minha mãe, "eu não te disse para te agasalhares e teres cuidado com os ares condicionados? Mas é sempre a mesma coisa, nunca ouvem o que eu digo". Sim, está bem, beijinhos, até amanhã.

Já quase parece um ritual, a constipação de mudança de estação. Esta até apareceu antes da chuva começar a cair a sério.

20 de setembro de 2006

DON'T YOU (FORGET ABOUT ME)

Acabei de apanhar na SIC Radical a última meia-hora de um filme que não vejo desde que estreou há 20 anos: "O Clube", de John Hughes. E fiquei espantado de reconhecer ali muito da minha própria adolescência — e creio que da de muita outra gente. É engraçado como é um filme de que quase ninguém se recorda (a não ser pela canção dos Simple Minds que se tornou num êxito internacional) ou que demasiadas pessoas definem como "demasiado americano" — pareceu-me ser apenas um filme sobre como é difícil ser-se adolescente (e há casos em que essa dificuldade não nos abandona quando "crescemos"). Sei que fiquei com vontade de o ter visto do princípio. Ou, quem sabe, de arranjar o DVD.

19 de setembro de 2006

POLAROID: PEQUENO ALMOÇO

Estou sentado a ler o jornal enquanto tomo o galão e o croissant com manteiga habituais das sextas de manhã. Na mesa à frente, sentam-se duas mulheres com duas crianças: avó e mãe, produzidas em negro, e dois meninos, irmãos, um dos seus cinco anos, o outro dos nove/dez, vestidos como os miúdos de hoje andam vestidos. A avó tresanda a um perfume enjoativo no qual parece ter tomado banho; as crianças falam alto como se estivessem em sua casa.

18 de setembro de 2006

POLAROID: THE MAN WITH THE MOVIE CAMERA

O turista, alto, barbudo, cinquentão, com ar de alemão, filma atentamente o toldo e a esplanada da pastelaria A Irlandeza, na esquina da Alexandre Herculano com a avenida da Liberdade, com a sua câmara de filmar, enquanto a sua esposa/companheira/amiga entra para comer qualquer coisa. O estafeta moto, parado no sinal em frente à espera que abra, ri por trás dos óculos escuros, enquanto o turista entra na pastelaria atrás da esposa/companheira/amiga.

17 de setembro de 2006

POLAROID: QUATRO PISCAS

O Renault Scénic pára à minha frente, no meio da estrada, com os quatro piscas acesos. A família sai toda do carro enquanto o pai abre a mala, para descarregar as compras da tarde no supermercado, que ele, a mãe e os dois filhos transportam para a porta de casa. Há uma abóbora gigantesca na mala, e às tantas o pai diz à filha, que está no passeio segurando com as duas mãos um pacote de uma dúzia de ovos, "Oh Marta, obrigadinho por ajudares". "Estou a segurar nos ovos!" "Punhas no chão para ajudar a tirar as coisas!"

Uma vez descarregadas as compras, o pai volta a entrar no carro e descobre um lugar para estacionar escassos metros à frente.

16 de setembro de 2006

UM RECADO PARA AS FEMINISTAS DE TODO O MUNDO

"I don't see women as women, I see them as human beings. So I don't believe that you must encourage women particularly. Introducing the issue is like dealing with women as handicapped members of society."

— Alaa Al-Aswany, romancista egípcio, na National Geographic (edição internacional inglesa) deste mês.

15 de setembro de 2006

PERGUNTA INOCENTE

Os adolescentes não podiam vir de fábrica com um botão regulador do volume de som da voz?

14 de setembro de 2006

UM COMENTARIO AOS COMENTARIOS

Só para vos descansar relativamente aos protestos que tenho recebido quanto aos comentários — a responsabilidade das "confusões" pertencem exclusivamente ao Blogger.com e também não percebo exactamente o que se está a passar.

13 de setembro de 2006

CHUVA CHUVA CHUVINHA

É oficial, o Verão acabou.

(João e Cristina, é favor não esfregarem as mãos de contentes.)

12 de setembro de 2006

POLAROID: METRO

Um casal negro dos seus 40 anos senta-se nos lugares ao meu lado no metro: ela à minha frente, elegantemente vestida em tons de terra, discretamente descalçando um dos sapatos para descansar o pé; ele ao meu lado, levantando-se logo a seguir para verificar alguma coisa no mapa da rede, enquanto ela pega no jornal que foi deixado na cadeira e que eu próprio já tinha folheado. Na estação seguinte, uma senhora dos seus 40-50 anos, cabelo louro, vestida de negro, entra e quase se senta no lugar vazio ao lado da senhora negra à minha frente, mas desiste da ideia e senta-se em vez disso nos lugares da frente. Apanho-lhe de passagem o olhar, frio, de uma segurança paredes-meias com a soberba, como quem diz "eu? sentar-me ao pé desses pretos?". Há algo de extraordinariamente português na aparência de porteira desencantada, de "vizinha" que sabe tudo o que se passa no bairro e que tem uma opinião sobre tudo e especialmente sobre aquilo do qual não percebe nada — e, uma ou duas estações mais à frente, vejo-a a concentrar aqueles olhinhos frios no tricot que está a fazer. O casal à minha frente não se apercebeu de absolutamente nada.

11 de setembro de 2006

11 DE SETEMBRO

A propósito das teorias da conspiração que circulam, gostei de ler isto. E também gostei bastante de ler este texto da Nancy Gibbs que não tem nada a ver com teorias da conspiração e tudo a ver com o modo como olhamos hoje para o mundo.

8 de setembro de 2006

ORGULHO DE SER PORTUGUÊS

Vejo nas paragens de autocarro um anúncio para uma revista que tem o slogan "orgulho de ser português", encimando uma capa da dita cuja revista dedicada a Alberto João Jardim. A ironia tem coisas destas.

7 de setembro de 2006

Ó PRÓ MEU IPOD TÃO ECLÉCTICO #5

Primeiro, "Tallahassee" dos Mountain Goats (4AD, 2002), o primeiro contacto que tive com o grande John Darnielle, autor de dois dos mais extraordinários álbuns que ouvi nos últimos anos ("We Shall All Be Healed" e "The Sunset Tree"), para tentar perceber se o novo "Get Lonely" é só tropeção menor de percurso. Confirma-se, "Tallahassee" é excelente e espero que "Get Lonely" seja mesmo só tropeção menor de percurso.

Depois, parte do excelente "Ultra" dos Depeche Mode (Mute, 1997), o disco que me parece indicar melhor que "Exciter" ou "Playing the Angel" o caminho que esta encarnação em trio do grupo devia seguir para soar moderno sem deixar de soar a Depeche Mode. Mas, claro, isto sou eu que acho.

6 de setembro de 2006

A TROTINETE DOS SEGURANÇAS

Se têm ido ao Colombo nos últimos tempos, já devem ter dado que alguns dos seguranças andam a passear por lá numa geringonça com rodas um bocado estranha, uma espécie de trotinete que anda sozinha. É um Segway e foi inventado há uns anitos por Dean Kamen como uma solução ecológica para o transporte individual urbano, funcionando a corrente eléctrica e de acordo com a própria rotação e movimento do corpo de quem anda em cima dele. A verdade é que o Segway não pegou junto do grande público — mas está a encontrar um pequeno nicho junto de empresas de segurança e departamentos de polícia. Eu pensei que dificilmente iria ver um ao vivo por cá — e não é que lá andam eles a passear pelo Colombo?

5 de setembro de 2006

O INTRÉPIDO OBSERVADOR VAGUEIA POR LISBOA

Hoje, na estação do metro do Rato, entra no comboio, ao meu lado, um senhor dos seus 50 anos, cabelos grisalhos escondidos debaixo de um boné de golfe. A camisa às riscas vermelhas e as calças de fazenda não me surpreendem grandemente, nem a sandália de couro preto a deixar ver o dedão do pé. Já a "pochette" cinzenta a tiracolo com o emblema do Sport Lisboa e Benfica bordado, e o porta-chaves suspenso do cinto em forma de T-shirt com o emblema do Benfica gravado, me fazem olhar duas vezes.

O que eu não estava mesmo nada à espera era dos auscultadores nos ouvidos do senhor, que desapareciam dentro da "pochette".

4 de setembro de 2006

METRO

Apesar de usar regularmente o metropolitano, devo ser um tipo com alguma sorte, porque não costumo apanhar os atrasos e interrupções de serviço de que muitos se queixam, embora ache que cinco minutos de intervalo entre comboios em hora de ponta não seja uma boa política. Esta manhã, contudo, na estação da Praça de Espanha, o comboio ficou parado à vontade uns bons dez minutos, sem grande explicação. Só quando me levantei do banco para espreitar pela porta percebi que um passageiro se tinha sentido mal na carruagem da frente e o comboio não arrancou enquanto o passageiro — um velhote de camisa branca, bóina e calças negras e ar de completo alheamento da realidade à sua volta que tinha visto sentado na estação do Marquês de Pombal, acompanhado de um homem de meia-idade com uma bóina de comando — saiu da carruagem com a ajuda de uma das funcionárias da estação e ficou ali, sentado no banco de madeira da estação, a olhar para o comboio que acelerava em direcção à estação seguinte.

3 de setembro de 2006

VOYEUR AUDITIVO

A senhora sobe e desce a minha rua, visivelmente transtornada, ora deixando a mala em cima de um dos blocos de betão que são supostos impedir carros de arrumar, ora voltando a pô-la ao ombro, ora pegando num molho de chaves, ora arrumando o molho de chaves. "Tu não percebes," diz ela, transtornada, ao telemóvel, com a cara muito vermelha e a voz à beira do grito, "ela é minha irmã e gosto mais dela do que mim." Seja o que for de que se falava, a conversa não era claramente leviana, e senti-me como se estivesse a intrometer-me numa conversa privada — que, contudo, se estava a ter em voz alta e a bom som em plena rua, com pelo menos mais um par de pessoas ali a ouvi-la.

1 de setembro de 2006

E SE A FIFA EXPULSAR OS CLUBES PORTUGUESES DAS COMPETIÇÕES INTERNACIONAIS ISSO É...

...culpa do futebol português, que parece estar mais interessado em lutas de galos e jogos de poder do que no desporto propriamente dito. Não é um exclusivo nacional, mas às vezes parece que os clubes do futebol só existem para que os dirigentes apareçam na televisão.