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18 de fevereiro de 2009

AS PALAVRAS DO MESTRE

"Let go of the spirit of the departed, and continue your life's celebration" 

— Allen Ginsberg a Patti Smith, citado no soberbo filme-ensaio de Steven Sebring, Dream of Life (estreia a 5 de Março). 
 

DESCONTEXTUALIZAR POR AÍ

"Ilda Figueiredo na marcha da radioactividade" — título do jornal Avante!, visto esta manhã numa banca de jornais

16/02/2009: TXL

São onze da manhã, estou à beira de fazer o check-out do hotel embora só tenha vôo às três da tarde (para Frankfurt e daí para Lisboa às seis da tarde, que a Lufthansa não tem vôos directos Berlim-Lisboa) e dou uma espreitadela no site do aeroporto para confirmar tudo — e lá está: os vôos para Frankfurt estão cancelados. 

Não penso duas vezes e despacho-me a ir para o aeroporto para tentar resolver a questão; eu e mais não sei quantas pessoas que estavam marcadas para o vôo anterior a fazer fila em frente ao balcão da Lufthansa, 45 minutos no meu caso. Dou as boas tardes à funcionária e digo-lhe que tinha lugar num dos vôos cancelados, a senhora solta um suspiro e lança, "pois, estamos aqui desde manhã a resolver isto, é muito frustrante queremos ajudar sem podermos...". Ao que parece, Frankfurt está fechado por causa do mau tempo, e Berlim também esteve a meio gás, afinal tinha estado a nevar non-stop desde a noite de sábado. 

Mas quando lhe digo que vou para Lisboa ela fica mais animadinha, "ah! assim é capaz de ser mais fácil". Numa demonstração de eficiência germânica a toda a prova, daí a dez minutos estou no vôo para Munique, que devia ter saído à uma da tarde mas atrasou uma hora, para apanhar depois a ligação para Lisboa às sete e meia. 

Com tudo isto, só cheguei a Lisboa uma hora mais tarde do que originalmente previsto. 

4 de fevereiro de 2009

PIAZZA ROSSA

Janto em Berlim num restaurante italiano, sentado ao lado de dois espanhóis que encomendam a refeição em inglês ao empregado alemão e falam um com o outro em catalão.

04/02/2009: LH 178 FRA 11h35-TXL 12h40

Nunca vi um vôo doméstico que não estivesse a abarrotar - e este, de Frankfurt para Berlim, estava mesmo em "overbooking" (sabe-se que um avião está em "overbooking" quando cinco minutos antes da hora da partida continua a entrar gente e já não há sítio para arrumar as malas que toda a gente quer trazer consigo). 

Vou na coxia. À minha esquerda, senta-se um espanhol corpulento (mas não em excesso) que dormita enquanto o vôo não descola e, quando partimos, faz o sinal da cruz antes de voltar a adormecer.  

04/02/2009: LH 4537 LIS 06h50-FRA 10h50

A única vantagem de apanhar um vôo tão madrugador é que o check-in, a segurança e o controle se fazem num instante, e temos tempo para nos sentarmos a tomar o pequeno-almoço descansados. Mesmo que ao nosso lado estejam três executivos que têm aquelas conversas de almoço entre executivos e que veja uma excursão turística de orientais que atravessam repetidamente o aeroporto à procura de alguma coisa que esteja aberta.  

1 de fevereiro de 2009

23/01/2009: CO 64 EWR 20h15-LIS 08h10

No vôo para Lisboa, nota-se a subida no número de passageiros portugueses assim que tomo o meu lugar e começo a ouvir as conversas. Uma família americana que mora em Portugal diz a um casal americano que visita o país pela primeira vez que as pessoas são muio simpáticas e amistosas e o país é lindíssimo, mas que os transportes públicos não funcionam e para terem cuidado com os couverts nas mesas dos restaurantes. Um casal de idosos que viaja com a filha e que está sentado na fila atrás de mim fala um com o outro de modo quase monossilábico: "Deixa-me ir para o meio." "Vai lá filha." Uma senhora que passa na coxia com a sua bagagem de cabina à frente diz para o seu colega de viagem enquanto olha para os compartimentos de bagagem sobre os lugares: "Ai, eu acho que a minha mala não cabe numa coisa destas." E, à saída do vôo, à espera que as bagagens saiam, dois homens com ar de bancários ou colegas de trabalho regressados de uma viagem de trabalho resmungam com o modo como as malas caem no carrocel de bagagens em cima das malas de um vôo anterior que ainda não foram levantadas porque os passageiros ainda estão a passar o controle dos Estrangeiros e Fronteiras.

23/01/2009: CO 62 IAH 14h22-EWR 19h00

Nem todos os vôos domésticos americanos fornecem refeição à borla — em alguns casos, há comida mas é paga à parte —, o que explica porque é que vejo tantos passageiros a embarcarem com sacos de papel do McDonald's, do Wendy's, do Starbucks, ou com garrafas de água ou de refrigerantes, ou com copos de café. No entanto, nos vôos que fiz nesta viagem (todos com a Continental), serviram refeição gratuita (mesmo que não muito melhor que o fast food do aeroporto...). O mais curioso foi mesmo observar as consequências dos fusos horários que "desaparecem" quando se viaja da Costa Oeste para a Costa Leste: saio de São Francisco no vôo para Houston das 7h40, servem o pequeno-almoço. Três horas de vôo depois, aterro em Houston às 13h23, para apanhar o vôo que sai para Newark às 14h22, onde servem almoço. Três horas de vôo depois, aterro em Newark às 19h00 para apanhar o vôo que sai para Lisboa às 20h15, onde servem jantar. 

23/01/2009: CO 1444 SFO 07h40-IAH 13h23

A célebre frase "quando mija um português mijam logo dois ou três" não é um exclusivo luso. É ver, nos vôos domésticos americanos, como toda a gente — sobretudo quem está sentado na coxia — se levanta assim que o sinal de "apertar os cintos" se apaga para usar a casa de banho. 

O PASSADO É UM PAÍS DISTANTE

Estou sentado no Starbucks da 18th com a Castro, a organizar notas, pensamentos, ideias, no dia a seguir à inauguração de Barack Obama e a meio das entrevistas que me trouxeram a São Francisco. Esta foi uma viagem "estranha", no sentido em que é a primeira vez que viajo em trabalho para uma cidade que até aqui só conheci enquanto destino de férias. Duas mesas mais à direita, dois homens de meia-idade de camisa aos quadrados, com aparência de camionistas (só faltam os bonés), discutem o vôo da US Airways que aterrou no rio Hudson. Na mesa à esquerda, um jovem que parece ter voltado do ginásio, a julgar pela toalha que espreita de um pequeno saco, afadiga-se a anotar em pequenos cartões palavras que lê num volumoso manual, com o telemóvel aberto junto ao computador. Uma mesa mais à frente, outro jovem trabalha frente a um portátil aberto. Quem não está ao telefone ou ao computador está a conversar ou a ler o jornal; "The world has changed", lê-se na primeira página do San Francisco Chronicle. Senti-o ontem quando vi, às nove da manhã locais, a inauguração em directo na televisão; sentiu-se a importância, o peso, a gravidade do momento. A ideia de que não vai ser fácil, mas que não temos medo e estamos aqui para as curvas. Apesar de todo o mal que se pode dizer dos americanos, há algo de notável neste desejo de reinvenção, nesta vontade de recomeçar do zero e fazer tábua rasa do que ficou para trás. O passado é um país distante, já dizia o Sérgio Godinho. 

ESTA

ESTA significa "Electronic System for Travel Authorization" e são as iniciais do novo sistema de autorização prévia que começou a ser obrigatório para todos os viajantes com destino aos EUA no dia 12 de Janeiro, poucos dias antes de eu viajar para São Francisco. Teoricamente, substitui os velhos formulários verdes, brancos e azuis que se preenchiam ao check-in ou no avião, eram entregues no Serviço de Estrangeiros e Fronteiras à entrada nos EUA e eram agrafados ao passaporte e, por consequente, acelerar e reduzir todo o "processamento". 

Digo "teoricamente" porque, no avião, a tripulação continuou a distribuir os formulários e, à minha passagem pelo SEF americano em Newark, ficou bem explícito que eles continuavam a ser solicitados, como disse bem alto uma das funcionárias: "Mesmo que tenham obtido a autorização online continua a ser necessário preencher os formulários verdes." Não abordei o assunto com o funcionário que processou os meus formulários, mas o viajante à minha frente abordou, na desportiva, e o funcionário, também na desportiva, explicou que ainda não tinham tido instruções para deixar de aceitar os formulários. Provavelmente porque ainda estávamos nos primeiros dias do novo sistema e era capaz de ser mais seguro garantir um backup no caso do sistema bloquear (o terminal 5 de Heathrow vem-me à cabeça).