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30 de novembro de 2006

CARREIRA 58

Uma das coisas mais curiosas em que reparo quando viajo de autocarro em Lisboa é a necessidade que algumas pessoas - maioritariamente idosos de todo o tipo - têm de conversar umas com as outras. E, geralmente, as conversas têm sempre um único tópico: dizer mal. Há sempre qualquer coisa que está mal, há sempre alguém que está a enganar alguém, são sempre os mesmos que são comidos, etc., etc., etc. É raríssimo ouvir uma palavra simpática nestas conversas de autocarro.

28 de novembro de 2006

WE LOVE LESMA

Pronto. Não consigo mesmo resistir a pôr aqui o clip da rave das lesmas que a Dreamworks e a Aardman puseram a correr há largas semanas para promover "Por Água Abaixo", que estreia por cá na quinta-feira. O clip não aparece no filme, mas dá uma ideia do que as lesmas estão lá a fazer — tipo pinguins de "Madagáscar" (mas "Por Água Abaixo" é uma comédia hilariante, enquanto "Madagáscar" era uma "sitcom" sem grande graça esticada para longa-metragem). Depois disto, nunca mais verão uma lesma da mesma maneira.

27 de novembro de 2006

NAO FAZ MAL, E PAPEL NA MESMA

Amigos meus de alma caridosa e bom coração haviam avisado que, à imagem dos seus irmãos felinos, D. Sofia Felina ia encetar uma relação muito íntima e proveitosa (para ela, que não para mim) com os rolos de papel higiénico. Até ver, tal não se concretizou.

Já com os guardanapos de papel, o caso muda de figura.

26 de novembro de 2006

FADISTICES

Há uma semana, Aldina Duarte na Culturgest, em rigorosa encenação de Jorge Silva Melo para apresentar o segundo (e menos conseguido) álbum, "Crua". Ontem, Cristina Branco no CCB, em antevisão do novo "Live". É curioso como o "futuro" do "Novo Fado" está cada vez mais ligado ao passado: Aldina está cada vez mais próxima das grandes castiças como Lucília do Carmo, em tom, em timbre, em enunciação, em entrega, em respeito pelo rigor e pela forma clássica do "Velho Fado"; Cristina assume cada vez mais reportório de Amália para o integrar na sua "canção" tangencial ao Fado, fazendo-o (coisa assombrosa que ainda nenhuma outra conseguiu fazer, nem mesmo Mariza ou Kátia) seu.

Ironicamente, ambas, de alguma maneira, "marcaram passo". Aldina porque se notava o nervosismo, a preocupação com uma marcação de palco a ser respeitada, que espartilhou a espontaneidade e o entusiasmo que lhe reconhecemos; a Culturgest pode ter esse lado intimidatório (Mafalda Arnauth também em tempos lá se espalhou), mas Aldina não o tinha sentido há ano e meio, na sua estreia naquele espaço, e sentiu-o desta vez. Cristina porque o seu concerto, para lá das interpretações de Amália que não faziam parte do seu reportório habitual, não é mais do que uma versão "extended" do "set" respeitante à digressão do sublime "Ulisses". Para Aldina, este concerto terá sido um degrau mais num crescimento artístico em progressão contínua dentro de uma lógica de transmissão do classicismo do Fado (e que magníficos acompanhantes são José Manuel Neto e Carlos Manuel Proença!). Para Cristina, a confirmação de uma voz e de um talento únicos que a transportam para um outro lugar para lá do Fado, mas sempre a ele ligado (mas Bernardo Couto é demasiado inexperiente para ser Custódio Castelo).

25 de novembro de 2006

NOTICIA DE ULTIMA HORA

Afinal, D. Sofia Felina já não tem medo do autoclismo. Pedimos desculpa pela informação errada.

24 de novembro de 2006

Os gauleses do Astérix têm medo que o céu lhes caia em cima da cabeça. Mais prosaicamente, D. Sofia Felina foge sempre que eu puxo o autoclismo.

23 de novembro de 2006

SINGING IN THE RAIN

Reconheço aos militares, enquanto cidadãos portugueses, todo o direito de passearem por onde muito bem entenderem, quando muito bem o entenderem, com quem muito bem o entenderem, e acho que toda esta história de passeios versus manifestações é um daqueles "fait-divers" que só em Portugal é que têm esta importância toda (no entanto, devo avisar que a utilização da frase "não foi para isto que os militares fizeram o 25 de Abril" ouvida ontem no Telejornal deduz pontos na classificação final).

Só que, aqui entre nós, isto de escolher um dia de temporal para ir passear para o Rossio não faz lá muito sentido... A gente sabe que "chuva civil não molha militar", mas ir ver montras com este tempo...

22 de novembro de 2006

ALGUEM QUE LHE EXPLIQUE QUE AS COISAS NAO SAO BEM ASSIM

No Telejornal do canal 1, um representante do sindicato dos professores que distribuia à população panfletos explicativos de qualquer coisa dizia à reportagem que a má reputação que os professores têm é uma maldosa mentira espalhada pela senhora Ministra da Educação. Mas a má reputação que os professores têm não é já anterior à actual Ministra? Ou o representante estava a falar de outra má reputação de que eu não sei nada?
Happy birthday, Bear!

I was lost
for so long
feels like it's taken
half my life
to find where
I belong

seeing you here
you're my nation
this is my application
give me hope
keep me sane
give me
indefinite leave to remain

all the worlds
that I saw
I went so far away
and still wanted you more

it may sound superficial
but can we make it official?
give me hope
keep me sane
give me
indefinite leave to remain

tell me where I stand
what do you envision?
one way or another
give me your decision now

is it time
to proceed?
will you give me a chance
and the status I need?

seeing you here
you're my nation
this is my application
give me hope
keep me sane
give me
indefinite leave to remain.


— Neil Tennant/Chris Lowe for the Pet Shop Boys: "Indefinite Leave to Remain", in "Fundamental" (Parlophone, 2006).

21 de novembro de 2006

ARE YOU READY TO BE HEARTBROKEN?

Aula Magna a menos de metade mas a enganar bem, 21h45, terça, 21 de Novembro de 2006. Em palco, Lloyd Cole, Neil Clark, umas poucas guitarras e um laptop Macintosh cinzento a fingir de caixa de ritmos numas poucas canções, a prova de que o pós-Commotions não fica a dever nada ao que está para trás e só não recebeu a mesma atenção (e quem editou o recente "Antidepressant" deve estar irritadíssimo por só ter havido três canções do disco novo)- 80 minutos contados (com dois míseros encores): soube a pouco. Mas soube tão bem.

Traffic
Like Lovers Do
Rattlesnakes
Past Imperfect
Butterfly
Late NIght Early Town
No More Love Songs
I'm Gone
New York City Sunshine
Are You Ready to Be Heartbroken?
2CV
My Other Life
Music in a Foreign Language
Pay for It
How Wrong Can You Be?
Why I Love Country Music
Cut Me Down
The Young Idealists
Perfect Skin
encore
Jennifer She Said
No Blue Skies

19 de novembro de 2006

A INSUSTENTAVEL LEVEZA DO SER FELINO

Às vezes, é muito fácil esquecer-me que a bola de pêlo felpuda e ternurenta que gosta de se aninhar no meu colo quando estou ao computador, que é de uma curiosidade tão inesgotável que chega a ser exasperante, é apenas um bebé de dois meses que ainda está a descobrir o mundo e passa a maior parte do dia a dormir como se não fosse nada com ela. A verdade é que sentir a Sofia no meu colo, ou no recanto do sofá que ela adoptou como o seu cantinho para dormir sozinha, a dormir a sono solto dá uma estranha sensação de sossego e quietude. Como se o simples facto daquele bichinho teimoso e curioso estar ali fizesse tudo estar bem. E se calhar está mesmo.

17 de novembro de 2006

O MOMENTO MICK JAGGER

Na magnífica peça de Joe Klein (um dos grandes analistas da política americana contemporânea, e o autor "anónimo" do romance que inspirou o filme de Mike Nichols "Escândalos do Candidato") que vem na Time desta semana a dissecar a derrota do Partido Republicano nas eleições intercalares americanas, descobre-se que há uma coisa chamada "the Mick Jagger moment". Descrita como — e passo a citar — "you can't always get what you want. The question is, can we get what we need?"

16 de novembro de 2006

WHAT HAVE WE DONE TO DESERVE THIS?

Pedro Santana Lopes vem a terreiro publicar um livro onde conta a sua versão dos catastróficos meses em que foi Primeiro-Ministro de Portugal. Não li, não tenho intenção de ler, cortei o som à conferência de imprensa nos telejornais e à entrevista de Judite de Sousa, não apanhei os comentários e as análises, mas quase aposto que vai dizer que o seu glorioso mandato foi interrompido cobardemente por aqueles que não reconheceram o seu talento inato e a sua visão luminosa de um Portugal melhor.

Enquanto isso, no mundo real...

15 de novembro de 2006

ORA NEM MAIS

"Being a Christian is no excuse for being stupid." Dick Armey, político republicano e católico praticante que não subscreve a actual tendência americana para o conservadorismo religioso fundamentalista, citado na Economist desta semana. Digam lá que não é uma belíssima frase.

14 de novembro de 2006

UM HOMEM NAO CHORA

Não sei se viram, na semana passada, aquela reportagem da RTP sobre os problemas psicológicos dos agentes da polícia e as altíssimas taxas de suicídio dos agentes da autoridade. Apanhei-a um pouco por acaso, mas a verdade é que fiquei perfeitamente elucidado sobre um pormenor: a velha imagem do polícia como "homem de ferro" já não corresponde minimamente à realidade. Os polícias são tão frágeis e humanos como as "pessoas normais", o que se pensarmos bem é apenas normal mas nada evidente.

Sempre achei que estas profissões "de risco" deviam ter um enquadramento psicológico muito sério — mas a reportagem deu a entender que nem por isso. Será que, nisto como noutras coisas, Portugal ainda acha no geral que tratamento psicológico é a mesma coisa que "ser maluquinho" e que "um homem resolve os seus problemas sozinho" e "um homem não chora"? Gostava de pensar que não — porque nenhuma dessas afirmações, assim como assim, é uma verdade universal — mas algo me diz que sim.

12 de novembro de 2006

NO TEMPO DO SALAZAR ISTO NAO ACONTECIA

O senhor dos seus 50 e muitos anos tem um cachecol de Portugal à volta do pescoço por cima do casaco de fazenda. Tem aquela "voz de aguardente" que identificamos com os lisboetas castiços dos bairros populares. Está sentado no autocarro cheio, tecnicamente a falar com as senhoras sentadas à sua frente e ao seu lado, mas ostensivamente a discursar para quem o quiser ouvir (e não há ninguém, neste 58 cheio em hora de ponta de fim de tarde, que não o consiga ouvir), e a discursar sobre tudo aquilo sobre o qual os lisboetas castiços dos bairros populares gostam de ter opinião. Desde nascer às portas de Benfica, quando a Amadora ainda pertencia ao concelho de Oeiras, a resmungar sobre a má educação da juventude contemporânea ("éramos dez filhos e o meu pai deu estudos a todos!"), vale tudo, rematado com a frase já habitual nos resmungos dos lisboetas castiços dos bairros populares de uma certa idade: "No tempo do Salazar isto não acontecia!"

11 de novembro de 2006

PALAVRAS DE QUE GOSTO MUITO MAS QUE NÃO TÊM GRANDE UTILIZAÇÃO PRÁTICA QUOTIDIANA #72

Pusilanimidade.

(ouvida da boca do João em discussão acalorada sobre os méritos do totalitarismo despótico aplicado à educação das jovens debutantes que insistem em exercer plenamente o seu mau gosto suburbano contra a iluminação recatada dos progenitores)

9 de novembro de 2006

ONOMATOPEIAS DO RONRONAR

A menina Alice diz que a gata dela quando ronrona soa a uma vitrine frigorífica do talho. Eu digo que a minha soa a um diesel em ponto morto. Alguém tem outras sugestões?

A FELICIDADE

...é, para os meus amigos americanos, a derrota do Partido Republicano nas intercalares americanas e a humilhação sofrida pelo presidente George Bush, e, acima de tudo, a demissão forçada de Donald Rumsfeld. Porque, aqui entre nós, um porradão de americanos também nunca estiveram nada de acordo com os seus governantes. Daí que alguns deles já falem em "Taking Back the House Party", numa alusão às "house parties" e à "reconquista da Casa dos Representantes" pelo Partido Democrata. A ver vamos — nós europeus somos um bocadinho mais cínicos politicamente.

(A despropósito: ver a oposição a opôr-se ao orçamento de estado do PS, ou seja, a fazer aquilo para que é paga, é ver o Eça actualizado para os nossos dias. Mas acho que já disse isto em qualquer lado.)

8 de novembro de 2006

COMO A ESPERA DO COMBOIO NA PARAGEM DO AUTOCARRO

À paragem do 9 na Álvares Cabral, pouco passa das nove da noite, chega uma jovem dos seus 20 e poucos anos. Apesar de ter chovido torrencialmente pouco antes, ela surge de cabelo escorrido e T-shirt justa de manga muito curta, com apliques em letras douradas na frente, e tresandando à distância a perfume, como se tivesse tomado banho na fragrância, de tal modo que, mesmo com a brisa que corre e não havendo mais ninguém da paragem, o odor enjoatiivo do perfume impondo-se rapidamente. São dez minutos de tormento enquanto o 9 não chega.

EU NAO PEÇO DESCULPA

Amo esta canção.

7 de novembro de 2006

CONSTATAÇAO

Os longos átrios e corredores da estação da Alameda que fazem correspondência entre as linhas verde e vermelha enchem-se de gente que se afadiga a passar aos intervalos regulares da chegada dos comboios. O gigantesco átrio da linha vermelha está quase sempre vazio, mesmo quando os passageiros se apressam para tomar o comboio para o Parque das Nações, ou quando os passageiros saem do comboio que acabou de chegar para fazer a correspondência.

6 de novembro de 2006

UMA PRENDA DE ANOS



Para a ursa honorária que hoje é também ursa maior. Não digas que vais daqui.

O HOMEM ALMOFADA

Tenho no colo há qualquer coisa como duas horas uma gatinha cinzenta de sete semanas que decidiu eleger o meu colo sentado como a almofada para a sua soneca da tarde. De nada servem as minhas idas à casa de banho ou à sala buscar uma banana para comer: assim que me apanha sentado, vá de cravar as garras nas minhas calças e erguer-se a pulso até ao meu colo para se enroscar confortavelmente e adormecer, alheia ao toque do telefone, às obras do andar de cima ou aos meus dedos no teclado.

5 de novembro de 2006

PALAVRAS DE QUE GOSTO MUITO MAS QUE NÃO TÊM GRANDE UTILIZAÇÃO PRÁTICA QUOTIDIANA #71

Basbaque.

(durante um "Saturday Night Constititutional to S. Pedro beach and back", inspirado pelos Marqueses de Marialva via Alexandre M.)

4 de novembro de 2006

CARIOCA

O que é assombroso ao ver Chico Buarque em palco é que ele é absolutamente o oposto do "animal de palco": não fala com o público, para lá do banal "obrigado" e da apresentação dos músicos; não se mexe em palco, mantém-se estático em frente ao microfone, com ou sem violão; sente-se, mesmo à distância de uma sala cheia, um desconforto evidente por estar fora do seu "habitat" natural.

E nada disso interessa quando Chico canta (mesmo que a voz já não seja exactamente a mesma), porque só ele sabe cantar estas canções desta maneira. E estas canções — todas as do magnífico "Carioca", mais uma série de escolhas oblíquas do seu passado onde quase não há espaço para os "greatest hits" que estão na boca de todos — cantadas desta maneira silenciam o Coliseu de Lisboa, preso às nuances da voz, da letra, da arte imensa de Chico Buarque. Se fosse com Caetano, quase aposto que o público começaria a resmungar. Com Chico, nem um alfinete se ouviu. O respeitinho é muito bonito.

3 de novembro de 2006

O MEU GURU (OU UM DOS)

Andrew Sullivan tornou-se num dos meus colunistas de referência. Sobretudo desde que, há largos meses já, apanhei um extraordinário ensaio dele sobre a religião (coisa que não professo) — e, depois, acompanhando diariamente o seu blog, descobri uma pessoa que se desvenda inteira na imensidão de "posts" que vai largando diariamente, assumindo por inteiro as contradições e paradoxos quase esquizofrénicos inerentes à sua condição humana.

Senão vejamos: Sullivan é um inglês formado em filosofia política, mas é um dos mais notáveis pensadores sobre a realidade política americana contemporânea, tendo feito dos States o seu país de adopção nos últimos 20 anos. É um conservador que não suporta o travesti que o actual Partido Republicano fez do conservadorismo; é um católico que não se revê no fundamentalismo cristão que tantos de nós identificamos com uma certa América; tem vindo a exigir abertamente a demissão de Donald Rumsfeld e, sendo um apoiante da intervenção americana no Iraque, é também um crítico aberto do modo como a administração Bush a conduziu e das falácias e manipulações mediáticas lançadas pela "maioria moral" americana. (Numa recente intervenção na CNN, disse que George W. Bush "perdeu a cabeça".) E é tudo isto sendo homossexual assumido publicamente e seropositivo, o que o torna numa voz desconfortável para muito boa gente que gosta dos seus colunistas encaixados em gavetas. Acaba de publicar um livro que vem bem recomendado pela Economist e que ele anda a promover honesta mas furiosamente no blog, chamado "The Conservative Soul".

E, pelo meio das suas reflexões sociopolíticas, vai falando dos seus cães (com fotos e tudo) e anda agora a postar os melhores e piores videos dos anos 80 sacados do YouTube. Digam-me, o Pacheco Pereira seria capaz de intercalar posts políticos hardcore inteligentes com telediscos dos New Order e dos Starship? Também me parecia que não.

2 de novembro de 2006

É curioso ver como os adolescentes contemporâneos se movimentam em rebanho. Hoje tive a oportunidade de o ver "in situ", primeiro na estação de metro do Campo Grande, depois na Alameda: a quantidade de grupos grandes que se formam nas plataformas e praticamente obstruem a passagem dos outros passageiros (sem que eles pareçam sequer aperceber-se de que não são os únicos à espera do comboio) é espantoso, uma espécie de migração tribal simultânea. "Estamos aqui, habituem-se", parecem dizer.