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28 de fevereiro de 2005

EQUILÍBRIO INSTÁVEL

Não, eu não tenho uma tribo; sempre preferi o vai-e-vem na corda bamba de quem não quer outra coisa que não seja uma tribo, mas também não quer pertencer realmente (medo de quê?). Até que chega um momento em que é preciso escolher entre ficar de fora (talvez de vez) ou fazer parte. Mas, para lá chegar, é preciso escavar. Muito.

something in me
dark and sticky
all the time it's getting strong
no way of dealing
with this feeling
can't go on like this too long

this time you've gone too far
this time you've gone too far
this time you've gone too far
I told you, I told you, I told you, I told you
this time you've gone too far
this time you've gone too far
this time you've gone too far
I told you, I told you, I told you, I told you
don't talk back
just drive the car
shut your mouth
I know what you are
don't say nothing
keep your hands on the wheel
don't turn around
this is for real

digging in the dirt
stay with me I need support
I'm digging in the dirt
to find the places I got hurt
open up the places I got hurt

the more I look
the more I find
as I close on in
I get so blind
I feel it in my head
I feel it in my toes
I feel it in my sex
that's the place it goes

this time you've gone too far
this time you've gone too far
this time you've gone too far
I told you, I told you, I told you, I told you
this time you've gone too far
this time you've gone too far
this time you've gone too far
I told you, I told you, I told you, I told you
don't talk back
just drive the car
shut your mouth
I know what you are
don't say nothing
keep your hands on the wheel
don't turn around
this is for real

digging in the dirt
stay with me I need support
I'm digging in the dirt
to find the places I got hurt
open up the places I got hurt

I'm digging in the dirt
stay with me I need support
I'm digging in the dirt
to find the places I got hurt
to open up the places I got hurt.


— Peter Gabriel, "Digging in the Dirt" (in "Us", Real World, 1992)

27 de fevereiro de 2005

RTP MEMÓRIA

Durante as minhas visitas de fim-de-semana à mãe, costumo pôr o televisor do quarto na RTP Memória, o que nos possibilitou, nos últimos dois sábados, assistir aos Festivais RTP da Canção de 1964, 1965 e 1966, que, vistos a esta distância, parecem verdadeiramente coisas de um outro tempo, desde os penteados bouffant de Maria Helena Fialho Gouveia, Simone de Oliveira e Madalena Iglésias à educação rígida de Henrique Mendes falando das "amáveis telefonistas", passando por Sérgio Borges a fazer a sua melhor imitação de Domenico Modugno. Com um misto de incredulidade (era mesmo assim?) e fascínio quase arqueológico (ah, era assim!). Ainda pertenço a uma geração para quem o Festival da Canção tinha alguma mística.

LOGBOOK #23: PISCINA (v1.0)

50 minutos de exercícios por cinco metros de fundo numa piscina para recordar aquelas técnicas básicas que se fazem no curso de mergulho e depois nunca mais se pensa nelas. No meu caso, questão importante: perceber o que se passava com a minha flutuabilidade com o equipamento dentro de água. Resposta: peso a mais. Descontando que a água doce é evidentemente menos densa que a água salgada, dei por mim sobre-lastrado em dois quilos, que tirei ao cinto com que costumo mergulhar — e voilà, a flutuabilidade melhorou significativamente, mesmo que haja menos stress numa piscina do que no mar. De qualquer maneira, agora é só confirmar no oceano que os nove quilos são o meu "peso ideal". (Por falar em flutuabilidade: já vos disse que ODEIO o raio do exercício do "buda"? Não? Então fica para outra altura.)

A remoção da máscara lá se fez sem grandes problemas, mas é algo que preciso de treinar mais; tenho demasiada tendência a expirar logo pelo nariz, o que pode facilitar a entrada de água pelas cavidades nasais. A subida com partilha de ar também correu bastante bem, excepto na variação "em cachimbo" em que o parceiro não percebeu o que se passava e se recusava a dar-me o raio do regulador depois de eu ter expirado o ar todo. Preciso claramente de treinar situações em que tenho de ir buscar o octopus por problema com o regulador primário.

O grande problema, contudo: a água da piscina estava a 12 graus. Nem em Sesimbra o raio da água está tão fria. (Torna-se urgente começar a estudar as opções e investir num semi-seco.)

25 de fevereiro de 2005

LUA CHEIA NA MARGINAL

A lua cheia está impossivelmente branca, um disco perfeito, gelado, suspenso no meio de uma infinitude de um azul negro. Conduzo pela Marginal, em direcção a Lisboa; não estou sozinho na estrada, mas sinto-me uma espécie de astronauta; porque o frio da escuridão entrecortada pelas lâmpadas amareladas e pelos faróis dos carros, lá fora, não engana. Ao longe, as luzes da zona ribeirinha de Algés-Belém, a ponte desenhada a pontos luminosos, alumiam sem força nem calor a escuridão; o reflexo esbranquiçado da lua cheia no mar chão, estanhado, também ele negro na escuridão da noite, desenhando uma espécie de caminho na água, como um trilho marítimo que os barcos pudessem seguir, a cauda de um cometa, uma luz desenhando a estrada. No Algarve, de Verão, a lua cheia reflectida no mar cria o mesmo efeito. Gosto destas ilusões de óptica.

UMA CANÇÃOZINHA PARA ANIMAR

Na voz, perdão, na Voz daquele que a criou, nos idos de 1959 (para o filme de Frank Capra, "Tristezas Não Pagam Dívidas"). Ladies and gentlemen, Frank Sinatra.

next time you're found with your chin on the ground
there's a lot to be learned
so look around

just what makes that little old ant
think he'll move that rubber tree plant
anyone knows an ant
can't
move a rubber tree plant

but he's got
high hopes
he's got
high hopes
he's got
high apple pie
in the sky
hopes

so any time you're gettin' low
'stead of lettin' go
just remember that ant

whoops, there goes another rubber tree plant

when troubles call and your back's to the wall
there's a lot to be learned
that wall could fall

once there was a silly old ram
thought he'd punch a hole in a dam
no one could make that ram
scram
he kept buttin' that dam

'cause he had
high hopes
he had
high hopes
he had
high apple pie
in the sky
hopes

so anytime you're feelin' bad
'stead of feelin' sad
just remember that ram

whoops, there goes a billion kilowatt dam

all problems just a toy balloon
they'll be bursted soon
they're just bound to go pop

whoops, there goes another problem kerplop


-- Sammy Cahn & James van Heusen para Frank Sinatra, "High Hopes" (in No One Cares, Capitol, 1959)

24 de fevereiro de 2005

AINDA A PROPÓSITO DOS URSOS FELIZES E DE CANTAR NO CHUVEIRO

Como não cantar (no chuveiro ou noutro sítio qualquer) quando confrontado com esta jóiazinha (ainda por cima a €22,00 cada caixa de três CDs?)

23 de fevereiro de 2005

22 de fevereiro de 2005

A PERSISTÊNCIA DA MEMÓRIA #14

Leio no metro/Metro (meio de transporte/jornal gratuito) sobre a existência de um grupo de moradores de Campo de Ourique que saltou em defesa do cinema Europa, que parece estar à beira de dar lugar a mais um bloco de apartamentos. Acho óptimo que se queira salvar o cinema Europa e a sua arquitectura tão anos 50, aquela assombrosa fachada cega e os alto-relevos estilizados, acho sempre óptimo que se queira salvar mais uma sala de cinema à beira do camartelo (pena é que não tenha havido mais manifestações do género quando tantos outros já foram destruídos).

Mas há vinte anos, talvez mais, que o cinema Europa não é sala de cinema aberta ao público, transformado durante grande parte dos anos 80 em estúdio televisivo da RTP, fechado desde que o canal público o deixou de usar. Há vinte anos, talvez mais, o cinema Europa não é equipamento cultural urbano, há pelo menos cinco anos que nada ali se passa. Não posso estar mais de acordo em devolver o cinema a Lisboa, mas urge que não aconteça o que aconteceu ao São Jorge, comprado pela Câmara Municipal em delírio eleitoralista de João Soares e deixado ao deus-dará numa programação tão sem rei nem roque como antes de fechar, apenas para dizer que existe e está aberto (e foi preciso a Festa do Cinema Francês e o IndieLisboa, iniciativas privadas, para provar que a sala pode ser rentável). E urge que não aconteça o que aconteceu quando, há algum tempo, um grupo de cidadãos iniciou uma campanha com vista à reabertura e requalificação do cinema Odeon, nos Restauradores, que terminou passados alguns meses após ter chamado a atenção das autoridades responsáveis para a situação daquela sala, mas sem que nada realmente tenha mudado.

Não tenho memórias do Europa enquanto espectador. Como de tantos outros cinemas de bairro de Lisboa — o Restelo, o Lumiar, o Paris (Estrela), o Royal Cine (Graça), o Salão Lisboa (Martim Moniz), o Cine Oriente (Sapadores), o Imperial (praça do Chile, mais tarde Pathé), o Lys (Intendente, mais tarde Roxy), o Rex (Socorro) — que ficavam "fora de mão" dos circuitos de estreia, dedicados às reprises ou às "continuações de estreia". Quando comecei a ir ao cinema em 1974/1975, eram salas "marcadas", que estavam já em declínio ou a encerrar. Mas são parte integrante de uma memória cinéfila que se tem vindo a perder com a cultura dos multiplexes, de um modo de pensar a construção e encenar o espectáculo que hoje não existe. O Europa é das mais extraordinárias manifestações arquitectónicas desse modo de pensar que conheço, mesmo que nunca tenha visto mais do que a sua fachada.

21 de fevereiro de 2005

POLAROID: ALASKA SASHIMI

Desenho num saco, hoje, no ginásio: um urso polar feliz com um peixe no regaço, dois pauzinhos na mão esquerda e a legenda "ALASKA SASHIMI".

20 de fevereiro de 2005

DEMOCRACIA EM MOVIMENTO

Legislativas 2005
Resultados provisórios às 22h40

PS: 45,03% (119 deputados) 2.571.173 votos

PSD: 28,70% (73) 1.638.560

CDU: 7,57% (14) 432.134

CDS-PP: 7,27% (12) 414.826

BE: 6,38% (8) 364.263

Votantes: 5.709.364 (65,01%)

Abstenção: 3.073.527 (34,99%)

Brancos: 103.539 (1,81%)

Nulos: 63.759 (1,12%)

Dados actualizados pelo Secretariado Técnico dos Assuntos para o Processo Eleitoral (Stape)


Portugal pronunciou-se (ou, enfim, 65% da população portuguesa). Porque será que não estou surpreendido (nem pelo pronunciamento, nem pela abstenção)? E porque será que não me consigo esquecer dos tugas truculentos, de meia-idade, que ouvi em conversa de balneário, hoje de manhã, no ginásio, queixando-se de que os políticos são todos a mesma bandalheira independentemente da sua cor? Um deles dizia que "só votaria quando Portugal fosse um país democrático". Ironia: a democracia promove a demissão que mais procura evitar.

A PERSISTÊNCIA DA MEMÓRIA #13

Fazendo o transbordo da "linha amarela" para a "linha azul" na estação de metro do Marquês de Pombal, ao descer a escada rolante que me leva ao cais da linha azul sentido Baixa-Chiado recordo-me da primeira escada rolante em que alguma vez andei na vida — precisamente no cais oposto, mas na anterior encarnação da estação, quando ainda tinha uma só linha e se chamava Rotunda, e se saía dela por um labiríntico sistema de corredores subterrâneos à praça do Marquês de Pombal. Aquela escada rolante era uma alegria. Mas, naquela altura, eu também gostava de elevadores.

PALAVRAS DE QUE GOSTO MUITO EMBORA NÃO TENHAM GRANDE UTILIZAÇÃO PRÁTICA QUOTIDIANA #56

Ultramarino.

19 de fevereiro de 2005

POLAROID

Uma senhora percorre a rua com uma menina de um, dois anos ao colo, bem agasalhada, que chora sem parar. A senhora procura acalmá-la, afagando-lhe o rosto, falando-lhe amorosamente, mas a menina não se cala. A senhora acaba por lhe lançar um grito. "Catarina! Francamente!" A menina continua a chorar.

17 de fevereiro de 2005

MARKETING POLITICO #5

A carta aos eleitores de José Sócrates tem um aspecto pobrezinho, linha de montagem, produção em massa. É curioso ver como as assinaturas de Sócrates e de Pedro Santana Lopes facsimiladas em ambas as cartas são igualmente anónimas.

A carta aos eleitores do CDS/PP é graficamente forte e apelativa; concorde-se ou não com as políticas, é uma peça de marketing cujo design (clássico e ao mesmo tempo moderno) se adequa na perfeição à mensagem que se quer passar, com um eficaz jogo de cores (o branco para facilidade de leitura, o azul forte do partido, o verde e vermelho da bandeira a servir de "tampão" discreto entre o azul e o branco). Continuo na minha, o PP parece-me claramente ter a estratégia de marketing mais afinada e bem pensada, e é curioso reparar como, na carta de Lisboa, se sublinha a antiga designação CDS em detrimento do PP.

Depois de Luís Filipe Menezes ter usado "tsunami", um outdoor do PSD a apelar à participação no comício de encerramento fala da "onda laranja [que] invade Lisboa". Não me parece do melhor gosto.

16 de fevereiro de 2005

MARKETING POLITICO #4

Hoje tinha na minha caixa do correio a célebre carta ao eleitor, contra a abstenção, de Pedro Santana Lopes. Quero agradecer ao nosso primeiro-ministro demissionário por me ter iluminado com a sua sabedoria e me ter mostrado que o meu voto é verdadeiramente importante, diria mesmo, crucial para acabar de vez com o despautério em que Portugal se tornou nos últimos seis meses.

E quero também agradecer-lhe por me ter proporcionado o momento mais único que jamais vivi na minha carreira de eleitoral. Nunca uma peça de marketing tinha sido tão eficaz a insultar a minha inteligência — e já vi umas quantas.

15 de fevereiro de 2005

O PAÍS REAL

Hoje, no Público, o habitual inquérito de rua versava o debate desta noite, perguntando aos transeuntes se achavam que ele iria ajudar os eleitores a tomarem a sua decisão. Entre uma doméstica que não liga à política e uma estudante que acha que não porque vai tudo votar em branco, havia uma deliciosa de um jovem que dizia, "eu acho que sim, mas sinceramente sou brasileiro".

13 de fevereiro de 2005

O ORÁCULO

O oráculo é como se chama aquela barra em movimento, no fundo do écrã, que se tornou hábito nos telejornais. Habitualmente, está cheia de gralhas, afirmações sem sentido ou non-sequiturs hilariantes, como hoje, no noticiário das 20h00 da RTP-1, em que breves frases sobre os dias de campanha dos partidos se viram entrecortadas pelo título "NABO GIGANTE EM FRONTEIRA".

O JOGO DAS ESCONDIDAS

De regresso a Lisboa, à saída da ponte 25 de Abril, vejo um carro da polícia parado do outro lado da estrada, na escapatória construída logo antes do tabuleiro. Está parado mesmo no cotovelo da escapatória, invisível a quem se dirige para a ponte. Estarão os agentes à cata de prevaricadores em alta velocidade, em operação de vigia, ou apenas a ler o jornal ou comer uma sandocha antes de pegar ou largar ao serviço?

LOGBOOK #22: INVERNO

Sesimbra: Ponta da Passagem, domingo 13 de Janeiro, 11h30: 16.1m, 48min, 13º C

Acho que nunca estive tão "ao largo" da Ponta da Passagem: o João Torres leva-me a contornar a "passagem" escavada na rocha costeira por fora, e é literalmente "por fora" — chegamos aos 16 metros e mais fundo iríamos se não tivéssemos dado meia volta, mas eu não me recordo de alguma vez ter saído tanto da "área conhecida". De qualquer maneira, a visibilidade está boa, as laminárias começam a aparecer (ainda em forma de enormes flores de um amarelo translúcido), sinal de que em breve começarão a aparecer muitos peixes. Um cardume vagueia por ali, brincamos com uma marinha que não parece mais fina do que um gressino, vejo um polvo a nadar elegantemente antes de se agarrar à rocha numa profusão de tentáculos. Mas está longe de ser o mergulho ideal: devo ter preso mal a máscara e lá se esgueira um jactozinho de água para o vidro esquerdo mais vezes do que seria necessário, treino a flutuabilidade mas continuo a estar demasiado pesado (vamos a ver se consigo tirar o quilo que já ando a querer tirar há muito tempo), está alguma corrente, de vez em quando puxo ar com tanta força que até puxo um bocadinho de água salgada. Ah, e a água também está fria, mas como levei o colete de aquecimento por baixo do fato, isso não foi problema. Excepto, claro, quando apanhámos com a deslocação do vento na viagem de barco de regresso a Sesimbra, porque aí rapei mesmo frio. E, apesar das luvas, as minhas mãos ainda se estão a queixar...

12 de fevereiro de 2005

O QUARTO PODER

As palavras do primeiro-ministro demissionário Pedro Santana Lopes sobre o alegado mau tratamento do PSD às mãos da imprensa têm algo de "boa cama faz quem nela se deita", porque nenhum outro dirigente do PSD cortejou a imprensa como Pedro Santana Lopes o fez ao longo dos anos. Mas, de quem pensou em lançar uma central de comunicação, não é uma declaração surpreendente.

10 de fevereiro de 2005

A LÍNGUA INGLESA É MUITO TRAIÇOEIRA

Na minha loja de conveniência, junto às caixas há aqueles expositores para pequenas gourmandises como chocolates e pastilhas elásticas. Hoje, enquanto esperava para pagar o jornal, reparei nas etiquetas feitas por computador que marcam os preços das pastilhas elásticas. "Chic Ice Canela", dizia uma. Logo ao lado, a etiqueta referente às equivalentes de "spearmint" (hortelã-pimenta, geralmente de cor verde) referia "Chic Ice Sperm".

PEQUENOS IRRITANTES QUOTIDIANOS #29

A tendência de colocar nos DVDs de filmes citações positivas de críticos americanos de publicações que ninguém em Portugal lê ou vê ou ouve.

8 de fevereiro de 2005

POLAROID: FNAC

Tarde de terça-feira de Carnaval. Em pleno café da Fnac do Chiado, uma senhora de idade está sentada numa mesa, um chá à frente, uma série de sacos, casacos e mala numa das cadeiras. Fala ao telemóvel, muito alto, e a sua conversa é partilhada por todo o café, com várias mesas ocupadas, mas relativamente silenciosas. A senhora diz que "estamos aqui no Chiado, viemos dar uma volta. Ele está bastante constipado", e mais algumas afirmações de ocasião. Dois homens travestidos de mulher entram, pedem cafés e sentam-se noutra mesa, como se nada fosse. Um deles, com aspecto bastante feminino, está bastante produzido, com uma saia longa e um chapéu vermelho numa toilette que deixa entrar o frio; o outro, mais masculino, com uma peruca, tem um kispo branco que lhe tapa o grosso da toilette, deixando apenas ver as meias e as botas de fantasia brancas. Nas cadeiras dispostas frente ao palcozinho, está sentado um negro com várias camadas de roupa e um lenço a envolver a cabeça, vários sacos ao seu lado no chão; quando passa o segurança, ele faz-lhe sinal com um sorriso, como quem diz "estou quase a ir-me embora".

6 de fevereiro de 2005

POLAROID: AV. D. JOÃO V

Esquina com a rua das Amoreiras, sábado, quatro da tarde. Ouço um ruído seco. Uma carrinha Audi, nova, impecavelmente preta, acaba de chocar com o Mercedes de modelo antigo mas em boa conservação á sua frente. Aparentemente, o Audi arrancou à espera que o Mercedes fizesse o mesmo, que não fez. Vapor branco sai do motor do Audi, que ficou com a grelha e o pára-choques amolgados, com a capota do motor entreaberta; há pedaços de carroçaria no chão. O Mercedes arranca lentamente para parar fora da faixa de rodagem, escassos metros à frente, e não incomodar o trânsito, mas o Audi já não mexe dali, e o condutor, depois de avaliar os estragos com um aspecto desanimado mas resignado, abre a mala para tirar o triângulo de sinalização. O Mercedes não apresenta absolutamente nenhum estrago.

MARKETING POLITICO #3

Novo outdoor para o PS, agora de fundo branco e com a frase "O voto que vai mudar Portugal". Sócrates está melhor nesta foto no que nos outdoors de pré-campanha, mas continua a haver algo ao lado na imagem. A concentração de mensagem está mais afinada e conseguida aqui no que em outdoors anteriores, mas é mais funcional que inspirado; também não me parece que seja por aqui, ainda por cima com uma frase tão vazia, que se vai convencer alguém.

5 de fevereiro de 2005

TRÊS SEMANAS

Faz, amanhã, três semanas que a minha mãe sofreu um enfarte, uma coisa extensa mas sem gravidade de maior. A surpresa foi tanto mais desagradável quanto ela era a última pessoa da família que nós achávamos atreita a problemas cardíacos, ainda por cima quando o meu pai usa um pacemaker há alguns anos e o meu irmão mais velho também tem problemas de coração. Depois de um rápido cateterismo que desbloqueou a artéria e uma semana em observação no Hospital de Santa Marta, onde foi impecavelmente tratada, regressou a casa — e, hoje como há duas semanas, passa o dia na cama, apavorada que possa sofrer um segundo enfarte, paralisada pelo pânico.

Antes do enfarte, era uma senhora frágil que se movia com dificuldade devido aos seus problemas reumáticos e de ossos, mas que fazia um esforço titânico para não ficar confinada às quatro paredes do seu quarto e, sobretudo, que mantinha a força de vontade que lhe permitia resmungar e refilar com a família toda como se fosse a dona da razão. Depois, é uma senhora frágil e abalada que não sai da cama, lamenta a sua "pouca sorte" e a sua dificuldade de restabelecimento, que desistiu de fazer qualquer tipo de esforço. Cada visita minha equivale a meia hora, uma hora em que faço a minha melhor cara de refilão bem disposto e lhe digo que aquilo não é vida, que ela está outra vez como nova (o que, segundo o cardiologista, é verdade) e que não há razão para se agarrar à cama, mas ela moita carrasco, e sou eu que regresso a casa bem menos bem disposto do que entrei.

Mas também é verdade que a minha mãe sempre foi uma casmurra de primeira apanha e nunca fez aquilo que nós achávamos melhor para ela mas sim aquilo que ELA achava melhor. Porque haveria esta vez de ser diferente? Será que é só uma questão de tempo até ela se capacitar ela própria da pasmaceira em que se está a enterrar, cada vez mais próxima da minha avó materna que passou os seus últimos anos sentada numa cadeira em casa da minha tia?

3 de fevereiro de 2005

DEBATE? QUAL DEBATE?

Sashimi de salmão. Need I say more?

MARKETING POLÍTICO #2

Novo outdoor, presumo que do PSD ou da JSD: algumas polémicas figuras socialistas atrás de José Sócrates com a legenda "Você quer que eles voltem?". Eles insistem num marketing negativo que pressupõe com confiança que a resposta do eleitorado é "Não", mas que não é capaz de admitir que a resposta do eleitorado pode ser "Sim". E, sobretudo, projecta uma imagem de quem, em vez de ter ideias para propôr ou uma atitude a defender, prefere atacar o adversário para desviar a atenção do que não tem para contrapor.

2 de fevereiro de 2005

POLÍTICA (slight return)

Dilema existencial: eu acho que a política que temos é absolutamente do pior e não merece que se lhe preste a mínima atenção, mas se não lhe prestarmos a mínima atenção não há a mínima possibilidade que ela possa melhorar, nem que seja só um bocadinho de nada.

PALAVRAS DE QUE GOSTO MUITO EMBORA NÃO TENHAM GRANDE UTILIZAÇÃO PRÁTICA QUOTIDIANA #55

Escanzelada.