São Francisco é uma cidade onde os restaurantes têm um "prazo de validade" muito relativo. Alguns clássicos nunca passam de moda, como o sublime Anchor Oyster Bar, onde se continuam a fazer os melhores pastéis de caranguejo que já comi (e eu nem sou um grande fã de caranguejo) e uma caldeirada de marisco de chorar por mais (dizem-me, porque não sou fã), e as ostras são fresquíssimas (isso, então, é mesmo coisa que não consigo comer). A experiência do hamburger de caranguejo, contudo, sem chegar ao nirvana do pastel de caranguejo, é francamente digna de repetir. Os preços, hélàs!, não são muito convidativos, mas para uma refeição especial vale mesmo a pena.
Sítio novo também de preços um bocadinho puxados, mas francamente recomendável, é o Boxing Room. A ideia é uma espécie de "nouvelle cuisine" da Louisiana, ou de clássicos da comida americana revistos por uma sensibilidade do Sul americano (exemplo: a entrada de amendoins cozidos à "cajun", que são cozidos inteiros com especiarias e vêm para a mesa ainda por descascar num pequeno caldeirão; ou o hamburger da casa, servido com "molho de mostarda crioula"). A comida é muito boa, mas a arquitectura é fabulosa: uma sala alta e envidraçada em madeira, arejadíssima, bem no centro de Hayes Valley, onde antes ficava o Citizen Cake (que mudou entretanto para a Fillmore). Toque de classe: as bebidas são servidas em pequenas canecas-jarro.
Outra novidade de preços mais em conta é o Starbelly, menos um restaurante do que um café-restaurante com "comfort food" (que se pode traduzir por "comida da mamã") ideal para os pequenos-almoços-almoçarados que fazem aqui tanto furor ao fim de semana e aos feriados: saladas, sanduíches, pizzas. Bem boas, por sinal, e servidas numa sala comprida com esplanada coberta e aquecida nas traseiras (sim, porque mesmo de Natal eles comem na rua).
Em vez das sobremesas de restaurante, no entanto, bom mesmo é fazer-se ao gelado caseiro das geladarias gourmet da cidade. Duas em particular merecem tudo, e numa comi provavelmente o melhor gelado que já provei: na Smitten, recém-inaugurada num jardinzinho de Hayes Valley, onde o gelado é (juro-vos) fabricado à frente do cliente, misturado numa máquina de azoto líquido. Isto limita o número de sabores disponíveis diariamente (um máximo de quatro, com uma máquina para cada sabor) mas garante também que o gelado é literalmente fresquíssimo, acompanhado por coberturas feitas na casa (experiência: baunilha com malte, com cobertura de praline de cacau em nougat). De fabrico caseiro igualmente mas mais tradicional são os gelados da Bi-Rite Creamery em Dolores Park, com sabores como mel e alfazema, caramelo salgado ou chá Earl Grey, acompanhados por bolachas e biscoitos feitos diariamente na própria loja. As filas, mesmo em pleno Inverno, dão a volta à esquina (o gelado de baunilha e chocolate com coco que provei justificava plenamente a espera).
Desconfio que vou recuperar os cinco quilos que tinha perdido.
Blog-notas de ideias soltas; post-it público de observações casuais; fragmentos em roda livre, fixados em âmbar. Eu, sem filtro. jorge.mourinha@gmail.com
Pesquisa personalizada
30 de dezembro de 2011
28 de dezembro de 2011
I've got an iPhone and I'm going to use it
Toda a gente em São Francisco tem um smartphone (e oitenta por cento dos smartphones de São Francisco são iPhones, mas isso agora não interessa nada), e toda a gente em São Francisco está permanentemente a fazer qualquer coisa com o smartphone ao pequeno-almoço, ao almoço, ao café, ao jantar, enquanto bebe um copo, etc. Não é um exclusivo americano, nem de São Francisco, mas atinge aqui uma dimensão que ainda não senti em Lisboa - ao ponto de ter visto alguém no Café Mystique a tirar uma foto do almoço com o iPhone. Tenho a sensação que, agora sim, estamos a entrar naquilo a que se chama "realidade aumentada".
por outras palavras:
a tecnologia é uma coisa maravilhosa não é?,
if you're going to San Francisco,
isto anda tudo ligado,
juventude em marcha,
made with a Mac,
telemóvel
25 de dezembro de 2011
timeout
Nos seis anos desde que visitei São Francisco pela primeira vez, muitas coisas têm vindo a mudar. Pode parecer uma verdade de La Palisse, mas é também um reflexo do modo como criamos "âncoras" numa cidade e da maneira como elas resistem, ou não, ao tempo.
Gostava de tomar um pequeno-almoço "à americana" no Welcome Home, que já fechou há uns anos. No seu lugar está agora o Café Mystique, onde não se come mal, mas que arma mais ao pingarelho do que o Welcome Home e onde o Michael Levy ia tendo um ataque com o serviço um bocadinho confuso. Sítios como o Blue e o Luna Café praticamente morreram em termos de qualidade da comida e do serviço; a cadeia Firewood continua a ser aquela solução eficaz de comida simples, funcional, bem feita e rápida. Dizem-me que o 2223 vai fechar de vez no Ano Novo, mas o La Méditerranée continua a ser uma boa opção, e o Nob Hill Cafe continua igual a si mesmo. A galeria comercial Metreon, ancorada por uma super-loja da Sony, está praticamente fechada - apenas sobraram os cinemas da AMC e pouco mais; a antiga loja da Virgin, mesmo em frente da loja da Apple, é agora mais uma loja de roupa; com a falência da Borders, a grande livraria da Union Square é agora um enorme espaço vazio e fechado. O supermercado Cala Foods da 18th passou para a cadeia Mollie Stone's.
O Castro Theatre, esse, continua em grande, com um programa de luxo que já passou pela Árvore da Vida de Malick (que ganha uma dimensão completamente nova visto com alguém especial) e, antes que 2011 acabe, ainda vai trazer dois Minnellis - Não Há como a Nossa Casa e A Roda da Fortuna -, dois Donen/Kelly - Serenata à Chuva e Um Dia em Nova Iorque -, Os Guarda-Chuvas de Cherburgo de Demy e Uma Mulher é uma Mulher de Godard. Dou por mim a pensar a falta que fazia uma sala destas em Lisboa, mas depois penso melhor e dou-me feliz por termos a Cinemateca. Os bilhetes é que estão carotes para o nível de vida local - dez dólares (sete euros) nas sessões normais do Castro, apenas dois ou três dólares mais baratos que uma sessão num dos grandes multiplex da cidade (sem 3D, evidentemente, com o qual o preço salta para os quinze dólares, ou onze euros e meio).
As ruas têm estado a abarrotar de consumistas natalícios; as compras nas lojas do costume (uma Amoeba, uma City Lights - e, actualmente, em São Francisco, livros e discos só podem mesmo ser comprados nestas lojas "mom-and-pop") ficaram, por isso, para depois do Boxing Day, o dia a seguir ao dia de Natal. Os Pittsburgh Steelers perderam escandalosamente com os San Francisco 49ers num jogo que ficou infame por ter faltado a luz duas vezes, mas compensaram esmagando os St. Louis Rams 27-0 na véspera de Natal (e sem o Big Ben na equipa).
E é bom deixarmo-nos embarcar em novas possibilidades de tradições de Natal. O espectáculo de Natal anual do San Francisco Gay Men's Chorus no Castro, equivalente local (numa estética obviamente menos convencional) do Concerto do Ano Novo de Viena, foi uma surpreendente revelação de bom humor e sábio equilíbrio entre solenidade e prazer. E a Missa do Galo anglicana, numa Grace Cathedral a abarrotar (hora e meia antes do início do serviço já quase não havia lugar sentado), um fascinante momento de ritual. Com uma atenção tão minuciosa à música sacra que mesmo os não-religiosos, como eu, puderam apreciar a beleza do momento.
Hoje é um momento de pausa. A todos um bom Natal.
Gostava de tomar um pequeno-almoço "à americana" no Welcome Home, que já fechou há uns anos. No seu lugar está agora o Café Mystique, onde não se come mal, mas que arma mais ao pingarelho do que o Welcome Home e onde o Michael Levy ia tendo um ataque com o serviço um bocadinho confuso. Sítios como o Blue e o Luna Café praticamente morreram em termos de qualidade da comida e do serviço; a cadeia Firewood continua a ser aquela solução eficaz de comida simples, funcional, bem feita e rápida. Dizem-me que o 2223 vai fechar de vez no Ano Novo, mas o La Méditerranée continua a ser uma boa opção, e o Nob Hill Cafe continua igual a si mesmo. A galeria comercial Metreon, ancorada por uma super-loja da Sony, está praticamente fechada - apenas sobraram os cinemas da AMC e pouco mais; a antiga loja da Virgin, mesmo em frente da loja da Apple, é agora mais uma loja de roupa; com a falência da Borders, a grande livraria da Union Square é agora um enorme espaço vazio e fechado. O supermercado Cala Foods da 18th passou para a cadeia Mollie Stone's.
O Castro Theatre, esse, continua em grande, com um programa de luxo que já passou pela Árvore da Vida de Malick (que ganha uma dimensão completamente nova visto com alguém especial) e, antes que 2011 acabe, ainda vai trazer dois Minnellis - Não Há como a Nossa Casa e A Roda da Fortuna -, dois Donen/Kelly - Serenata à Chuva e Um Dia em Nova Iorque -, Os Guarda-Chuvas de Cherburgo de Demy e Uma Mulher é uma Mulher de Godard. Dou por mim a pensar a falta que fazia uma sala destas em Lisboa, mas depois penso melhor e dou-me feliz por termos a Cinemateca. Os bilhetes é que estão carotes para o nível de vida local - dez dólares (sete euros) nas sessões normais do Castro, apenas dois ou três dólares mais baratos que uma sessão num dos grandes multiplex da cidade (sem 3D, evidentemente, com o qual o preço salta para os quinze dólares, ou onze euros e meio).
As ruas têm estado a abarrotar de consumistas natalícios; as compras nas lojas do costume (uma Amoeba, uma City Lights - e, actualmente, em São Francisco, livros e discos só podem mesmo ser comprados nestas lojas "mom-and-pop") ficaram, por isso, para depois do Boxing Day, o dia a seguir ao dia de Natal. Os Pittsburgh Steelers perderam escandalosamente com os San Francisco 49ers num jogo que ficou infame por ter faltado a luz duas vezes, mas compensaram esmagando os St. Louis Rams 27-0 na véspera de Natal (e sem o Big Ben na equipa).
E é bom deixarmo-nos embarcar em novas possibilidades de tradições de Natal. O espectáculo de Natal anual do San Francisco Gay Men's Chorus no Castro, equivalente local (numa estética obviamente menos convencional) do Concerto do Ano Novo de Viena, foi uma surpreendente revelação de bom humor e sábio equilíbrio entre solenidade e prazer. E a Missa do Galo anglicana, numa Grace Cathedral a abarrotar (hora e meia antes do início do serviço já quase não havia lugar sentado), um fascinante momento de ritual. Com uma atenção tão minuciosa à música sacra que mesmo os não-religiosos, como eu, puderam apreciar a beleza do momento.
Hoje é um momento de pausa. A todos um bom Natal.
por outras palavras:
a aventura continua,
É Natal,
home away from home,
if you're going to San Francisco,
isto anda tudo ligado,
o imaginário cultural
19 de dezembro de 2011
é Natal, é Natal
Estão a ver a cena da Fantasia de Natal com o palhaço que foi com o coelhinho no comboio ao circo? Juro que ontem vi um presépio de Natal que tinha uma montanha-russa. Não estou a brincar. Tentaremos obter provas.
18 de dezembro de 2011
UA 931
À minha frente no voo para São Francisco, está um pai indiano que viaja com os dois filhos; ele e o filho estão junto à janela na fila da frente, a filha na janela da fila à frente deles. Ao longo das dez horas de voo, ele passa a vida a incomodar a vizinha da coxia para ir à bagageira buscar chocolates, batatas fritas, livros, iPods e afins que estão numa das duas malas ou na mochila que estão na bagageira por baixo dos casacos dos três, ou então passa a vida a trocar de lugar com o filho ou com a filha, mesmo quando o voo atravessa turbulência e o sinal de cintos apertados está ligado. A senhora da coxia, que já teve de ficar sem jantar porque não gostava da opção de galinha ou massa e não havia refeições vegetarianas, não protesta, mas um dos comissários de bordo, quando vou à casa de banho, diz-me, "Se depois puder dizer ao senhor que está na fila da frente para ficar sentado quando está o sinal de cintos apertados ligado... Eu já percebi que não deve servir de muito, mas faz parte das minhas funções."
17 de dezembro de 2011
TP 354 / UA 931
No voo para Londres, a comissária de bordo chamava-se Cláudia Vanessa. No voo para São Francisco, há uma hospedeira chamada Vanessa, que fala francês com os colegas e resmunga de modo muito francês: que está muito calor, que os serviços nunca mais acabam. E que parece estar tão concentrada em resmungar que passa o tempo todo distraída.
16 de dezembro de 2011
TP 354
A passageira brasileira sentada atrás de mim chama-me. "Desculpe, importava-se de não recostar a cadeira para trás? Já estou com o joelho no limite."
TP 354
No autocarro que leva do terminal de Lisboa para o avião para Londres, ficamos alguns momentos com as portas fechadas à espera do OK para seguir. Há um grupinho de amigas - colegas de repartição? colegas de escritório? de secretaria? - uma das quais não se cala, resmunga por estarmos parados com as portas fechadas (apesar de estar frio às oito da manhã), protesta porque diz que qualquer atraso são "duas ou três horas a menos que estamos em Londres" e diz à amiga "estás enjoada? estás aí tão caladinha quando costumas ser tão tagarela".
6 de dezembro de 2011
da série "pequenos irritantes quotidianos", #52
As senhoras de meia-idade que, nos transportes públicos, decidem mandar muitos beijinhos e brincar com os/as bebés e os meninos/meninas dos outros, o que geralmente tem mau resultado nas criancinhas.
2 de dezembro de 2011
tudo isto existe
Temos mesmo de ouvir agora fado no metro? A sério? Era mesmo preciso? E já alguém pensou que não é "cá para dentro" que temos de vender o fado como património da humanidade, mas "lá para fora"?
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