Blog-notas de ideias soltas; post-it público de observações casuais; fragmentos em roda livre, fixados em âmbar. Eu, sem filtro. jorge.mourinha@gmail.com

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3 de agosto de 2012
a fila
Na fila para comprar o jornal, uma senhora velhota pergunta se precisa de ir para a fila para pagar a revista Telenovelas porque já lá tinha estado antes. O caixa diz que tem de ir para a fila a não ser que as pessoas à minha frente a deixassem pagar primeiro - e as pessoas à minha frente, que são um casal velhote, deixam. Isto apesar de eu também só querer comprar um jornal e de ter ido para a fila na mesma. É daquelas coisas que me leva a questionar exactamente qual é a noção de "civismo" dos portugueses.
30 de julho de 2012
eu sou uma mulher muito ocupada
A senhora está de pé na recepção do centro de saúde, com aquele ar enfadado de quem tem muito que fazer à segunda de manhã e não está para estar ali a perder tempo desnecessariamente, consultando o telemóvel todos os dez segundos e afivelando o ar de "eu sou uma pessoa importante e não estou para ficar aqui à espera". Assim que a senhora que está a ser atendida termina, dirige-se à funcionária administrativa com o mal-disfarçado desdém de quem não está para isto, atira com a sua senha para a mesa e diz-lhe, de alto e sem sequer se sentar, "olhe, eu estou aqui à espera só porque preciso de uma justificação para o emprego". Ao longo dos cinco minutos seguintes, chega ao ponto de dizer à funcionária o que ela deve escrever no justificativo, agastada por a sua médica ter faltado. "É a segunda vez num mês, e ela falta sempre à segunda-feira. Eu também gosto de fins-de-semana prolongados mas tenho de trabalhar à segunda-feira." A funcionária pergunta-lhe: "9 e 25?" "9 e 25 o quê?" "São 9 e 25." "Ponha 9 e 30, que são os cinco minutos que eu levo a chegar lá acima. E escreva que não fui atendida por falta da médica, senão ainda acham que eu não tinha consulta nenhuma."
18 de julho de 2012
não há ninguém capaz de me dar alergia
A senhora sentada ao balcão da cafetaria do Corte Inglés não se cala: diz ao homem com quem está e a quem a quiser ouvir que a comida ali é toda uma porcaria e não há um prato de jeito e o atendimento é muito demorado. Dou por mim com vontade de lhe dizer: se não gosta porque é que não vai comer a outro lado?
3 de julho de 2012
745 (entre o filme e o médico)
Um homem andrajoso e sujo entra no autocarro e dirige-se para os lugares das traseiras; atrás de si deixa o odor característico de quem não se lava há muito tempo. Algumas paragens mais à frente, entram os revisores da Carris para verificar os bilhetes. Quando o revisor chega ao homem andrajoso e sujo, este responde "não tenho passe nem tenho bilhete nem tenho dinheiro". O revisor grita para o condutor abrir a porta e o senhor, depois de repetir "não tenho passe nem tenho bilhete nem tenho dinheiro", sai do autocarro. Uma senhora ouve-se a dizer "se fosse eu ele ou não tinha entrado ou pagava a multa como as outras pessoas".
28 de junho de 2012
de bestiais a bestas (ou a ressaca do ludopédio)
Ouvido no café ao pequeno-almoço depois da derrota com a Espanha: "Dou mais cinco anos ao Cristiano Ronaldo. Sem ele, o que é que Portugal tem? Nada. O Bruno Alves é atrasado mental. Aquele Postiga? Não joga nada, está no Saragoça não joga no Saragoça, o Sporting não o quis, não joga nada. Portugal deu um baile à Espanha? Portugal não jogou nada, quantos espanhóis jogaram à sua altura habitual? Dois."
22 de junho de 2012
713 (ar condicionado)
Porque é que as pessoas vêem sempre nas janelas dos autocarros a indicação "ar condicionado. Por favor manter a janela fechada" e apesar disso abrem sempre a janela?
21 de junho de 2012
a fúria do açúcar
No café do Classic Alvalade, enquanto espero por uma projecção, um sem-abrigo (sujo, determinado, mal vestido) entra pelo café dentro e dirige-se à minha mesa. Penso que me vai pedir esmola ou que lhe pague um café. Em vez disso, diz-me "posso?" e dirige a mão para o meu queque. Digo-lhe que não. Agarra então na chávena de café praticamente vazia e, enquanto pergunta de novo "posso?", perante o meu ar atónito (e das empregadas do café) antes que eu possa dizer que "não", bebe o resto do café, pousa a chávena e lança-me quase ofendido "não tem açúcar!".
Enquanto as empregadas tentam desesperadamente correr com o homem, ele faz exactamente o mesmo com outras mesas antes que o projeccionista consiga finalmente pô-lo fora. Perguntam-se se será um fugido do Júlio de Matos.
Enquanto as empregadas tentam desesperadamente correr com o homem, ele faz exactamente o mesmo com outras mesas antes que o projeccionista consiga finalmente pô-lo fora. Perguntam-se se será um fugido do Júlio de Matos.
20 de junho de 2012
727 (a voz do povo)
Diz a moça encostada à porta do autocarro vestida de modo espalhafatoso e com voz rouca, saltos altos e cabelo louro, para o senhor velhote que se prepara para sair: "O senhor saia lá e não caia, em vez de estar a olhar para onde não deve..."
16 de junho de 2012
15 de junho de 2012
continente, bom dia
"São nove euros e cinquenta e cinco," diz o empregado da caixa do supermercado à cliente que lhe perguntara se seria possível "fazer um embrulho" para uma das compras (e ao que ele respondera "tenho que ver").
"Puxa!", responde a senhora, "já não se pode sair de casa hoje! Já viu isto?", diz a uma vizinha que está na fila mais à frente à espera da sua vez, "Uma pessoa sai à rua e é sempre a gastar dinheiro, mais vale ficar trancada em casa, assim ao menos não gosto dinheiro."
"E já lá foi?" pergunta a vizinha na fila.
"Fui lá com a filha da minha prima," responde a senhora, "e já lhe conto uma assim que pagar", diz enquanto se dirige ao segurança da loja para ver se ele lhe faz o embrulho.
"Puxa!", responde a senhora, "já não se pode sair de casa hoje! Já viu isto?", diz a uma vizinha que está na fila mais à frente à espera da sua vez, "Uma pessoa sai à rua e é sempre a gastar dinheiro, mais vale ficar trancada em casa, assim ao menos não gosto dinheiro."
"E já lá foi?" pergunta a vizinha na fila.
"Fui lá com a filha da minha prima," responde a senhora, "e já lhe conto uma assim que pagar", diz enquanto se dirige ao segurança da loja para ver se ele lhe faz o embrulho.
3 de junho de 2012
738 (explicit lyrics)
Quatro turistas alemães, no autocarro, falam entre si em alemão. Um senhor de meia-idade, à aproximação do Marquês de Pombal, dirige-se-lhes em francês, apontando a paragem: "Marquês de Pombal. La prochaine." Os turistas não percebem se o senhor está a falar com eles e continuam a falar entre si. O senhor fala para o ar, com ar ofendido e desconfiado: "São estes cabrões que nos andam a roubar e nós sem fazer nada." Saem todos juntos na paragem do Marquês e enquanto o autocarro parte vejo o senhor a dirigir a palavra aos turistas alemães.
por outras palavras:
a voz do povo,
é a cultura,
isto anda tudo ligado,
observações descentradas,
portugal no seu melhor,
viva o transporte público
31 de maio de 2012
30 de maio de 2012
28 de maio de 2012
22 de maio de 2012
19 de maio de 2012
16 de maio de 2012
coisas que se ouvem nos transportes públicos
Tinaiger inconsciente, loura de cabelo escorrido, vestida de cores garridas psicadélicas muito veraneantes, com sorriso de aparelho dentário, auscultadores de MP3 (um num ouvido, o outro pendurado) e telemóvel pendurado ao pescoço num cordão colorido: "Ai, não era aqui que eu tinha de ter saído!" Tinaiger inconsciente, moreno, T-shirt, calções, ténis de lona e mochila de surf fashion: "Então?" Ela: "Não era aqui, a casa dele fica bué longe!" Ele: "Então boa viagem!"
15 de maio de 2012
live ditt hem
Alguém conhece alguém que more verdadeiramente numa casa tão impecável como as que aparecem no catálogo da IKEA (ou pelo menos alguém que não seja sueco)? Será a isto que se chama "marketing aspiracional"?
14 de maio de 2012
30 de dezembro de 2011
o delírio das papilas gustativas
São Francisco é uma cidade onde os restaurantes têm um "prazo de validade" muito relativo. Alguns clássicos nunca passam de moda, como o sublime Anchor Oyster Bar, onde se continuam a fazer os melhores pastéis de caranguejo que já comi (e eu nem sou um grande fã de caranguejo) e uma caldeirada de marisco de chorar por mais (dizem-me, porque não sou fã), e as ostras são fresquíssimas (isso, então, é mesmo coisa que não consigo comer). A experiência do hamburger de caranguejo, contudo, sem chegar ao nirvana do pastel de caranguejo, é francamente digna de repetir. Os preços, hélàs!, não são muito convidativos, mas para uma refeição especial vale mesmo a pena.
Sítio novo também de preços um bocadinho puxados, mas francamente recomendável, é o Boxing Room. A ideia é uma espécie de "nouvelle cuisine" da Louisiana, ou de clássicos da comida americana revistos por uma sensibilidade do Sul americano (exemplo: a entrada de amendoins cozidos à "cajun", que são cozidos inteiros com especiarias e vêm para a mesa ainda por descascar num pequeno caldeirão; ou o hamburger da casa, servido com "molho de mostarda crioula"). A comida é muito boa, mas a arquitectura é fabulosa: uma sala alta e envidraçada em madeira, arejadíssima, bem no centro de Hayes Valley, onde antes ficava o Citizen Cake (que mudou entretanto para a Fillmore). Toque de classe: as bebidas são servidas em pequenas canecas-jarro.
Outra novidade de preços mais em conta é o Starbelly, menos um restaurante do que um café-restaurante com "comfort food" (que se pode traduzir por "comida da mamã") ideal para os pequenos-almoços-almoçarados que fazem aqui tanto furor ao fim de semana e aos feriados: saladas, sanduíches, pizzas. Bem boas, por sinal, e servidas numa sala comprida com esplanada coberta e aquecida nas traseiras (sim, porque mesmo de Natal eles comem na rua).
Em vez das sobremesas de restaurante, no entanto, bom mesmo é fazer-se ao gelado caseiro das geladarias gourmet da cidade. Duas em particular merecem tudo, e numa comi provavelmente o melhor gelado que já provei: na Smitten, recém-inaugurada num jardinzinho de Hayes Valley, onde o gelado é (juro-vos) fabricado à frente do cliente, misturado numa máquina de azoto líquido. Isto limita o número de sabores disponíveis diariamente (um máximo de quatro, com uma máquina para cada sabor) mas garante também que o gelado é literalmente fresquíssimo, acompanhado por coberturas feitas na casa (experiência: baunilha com malte, com cobertura de praline de cacau em nougat). De fabrico caseiro igualmente mas mais tradicional são os gelados da Bi-Rite Creamery em Dolores Park, com sabores como mel e alfazema, caramelo salgado ou chá Earl Grey, acompanhados por bolachas e biscoitos feitos diariamente na própria loja. As filas, mesmo em pleno Inverno, dão a volta à esquina (o gelado de baunilha e chocolate com coco que provei justificava plenamente a espera).
Desconfio que vou recuperar os cinco quilos que tinha perdido.
Sítio novo também de preços um bocadinho puxados, mas francamente recomendável, é o Boxing Room. A ideia é uma espécie de "nouvelle cuisine" da Louisiana, ou de clássicos da comida americana revistos por uma sensibilidade do Sul americano (exemplo: a entrada de amendoins cozidos à "cajun", que são cozidos inteiros com especiarias e vêm para a mesa ainda por descascar num pequeno caldeirão; ou o hamburger da casa, servido com "molho de mostarda crioula"). A comida é muito boa, mas a arquitectura é fabulosa: uma sala alta e envidraçada em madeira, arejadíssima, bem no centro de Hayes Valley, onde antes ficava o Citizen Cake (que mudou entretanto para a Fillmore). Toque de classe: as bebidas são servidas em pequenas canecas-jarro.
Outra novidade de preços mais em conta é o Starbelly, menos um restaurante do que um café-restaurante com "comfort food" (que se pode traduzir por "comida da mamã") ideal para os pequenos-almoços-almoçarados que fazem aqui tanto furor ao fim de semana e aos feriados: saladas, sanduíches, pizzas. Bem boas, por sinal, e servidas numa sala comprida com esplanada coberta e aquecida nas traseiras (sim, porque mesmo de Natal eles comem na rua).
Em vez das sobremesas de restaurante, no entanto, bom mesmo é fazer-se ao gelado caseiro das geladarias gourmet da cidade. Duas em particular merecem tudo, e numa comi provavelmente o melhor gelado que já provei: na Smitten, recém-inaugurada num jardinzinho de Hayes Valley, onde o gelado é (juro-vos) fabricado à frente do cliente, misturado numa máquina de azoto líquido. Isto limita o número de sabores disponíveis diariamente (um máximo de quatro, com uma máquina para cada sabor) mas garante também que o gelado é literalmente fresquíssimo, acompanhado por coberturas feitas na casa (experiência: baunilha com malte, com cobertura de praline de cacau em nougat). De fabrico caseiro igualmente mas mais tradicional são os gelados da Bi-Rite Creamery em Dolores Park, com sabores como mel e alfazema, caramelo salgado ou chá Earl Grey, acompanhados por bolachas e biscoitos feitos diariamente na própria loja. As filas, mesmo em pleno Inverno, dão a volta à esquina (o gelado de baunilha e chocolate com coco que provei justificava plenamente a espera).
Desconfio que vou recuperar os cinco quilos que tinha perdido.
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