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6 de fevereiro de 2004

POLAROID METRO

Momentos antes, no cais da Alameda, enquanto esperávamos pelo comboio, falávamos desses personagens estranhos que percorrem Lisboa, aparentemente desfasados do quotidiano normal ou apenas vivendo num quotidiano seu onde as regras normais não se aplicam. Da senhora que sobe às vezes a minha rua e se detém algumas portas abaixo da minha, em frente a um pátio à antiga, para proferir longamente impropérios dirigidos a um morador do pátio de quem, segundo julgo compreender, terá sido companheira. Do escarcéu à antiga lisboeta que se cria nesses momentos irregulares.

Estávamos, os três, encostados à divisória que abre para a cabine, a conversar. À aproximação de uma estação, um senhor dos seus 50 anos sentado num dos bancos levanta-se. Traz um anorak azul de modelo antigo, uma pasta; tem os cabelos e o bigode grisalhos, usa óculos, a tez pálida que identifico com um fumador em excesso. Agarra-se ao varão central como se fosse sair na próxima estação, virado para nós, mas não sai. Fica a olhar para nós como se estivesse a ouvir a nossa conversa, como se fizesse parte do nosso grupo, como se nos fosse perguntar alguma coisa. Olha para mim, ora para M., ora para C., de acordo com o fluir da conversa. Reparamos, mas fingimos que não, continuamos a conversar como se nada fosse, escondemos o incómodo o melhor que podemos. Na chegada à estação seguinte, larga o varão e coloca-se em frente à porta, muito encostado, e sai assim que as portas abrem.

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