Por vezes — e são mais do que seria correcto — não gosto de Portugal. Não gosto de viver num país onde estou cansado de ouvir promessas para mudar coisas que depois nunca mudam, onde (como dizia o poeta Godinho) tudo muda para que tudo fique igual, onde as pessoas estão mais interessadas em erguerem-se a si próprias do que a erguer coisas com futuro, onde se prefer ouvir os bajuladores que bajulam em vez das vozes lúcidas que vêem as coisas como elas são (mas verão realmente?). Por vezes, olho para este cantinho onde vivo; percorro a Marginal e vejo o mar a bater na praia de Santo Amaro, o comboio a saír do túnel quando começo a descer na curva que leva aos semáforos da Cruz Quebrada, e pergunto-me como é possível que Portugal tenha sido bafejado por sítios tão bonitos habitados por gente tão baixa, que diz (como hoje ouvi a uma senhora numa reportagem sobre atendimento demorado nas repartições de finanças de Bragança) que se está hoje pior do que no tempo do Salazar; e depois mudo o canal e vejo figuras públicas (Ferreira do Amaral, Mário Tomé, Carvalho da Silva) a recordarem episódios do seu tempo de guerra colonial, emocionados, com uma dor inexplicável a transparecer nas suas palavras. E pergunto-me como é possível. E penso um pouco e depois deixo de me perguntar; porque não vale a pena. Fica só uma tristeza funda, surda, cá dentro; um atavismo resignado de saber que há coisas que, por mais que se queira, por mais que se tente, não mudam.
Só nos podemos mudar a nós próprios, cada um de nós por si. Os outros não são — não podem ser — problema nosso; já é tão difícil mudarmo-nos a nós que não é certo que haja energias para o resto.
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