Às vezes, penso que todos estes fanatismos futebolísticos, estas pirraças que se geram entre lampiões, dragões, lagartos ou (insira aqui a alcunha popular do seu clube preferido), são algo de atávico, uma espécie de desculpa para, na idade adulta, podermos reencontrar a simplicidade impulsiva das brincadeiras de infância e adolescência. Porque as disputas mais ou menos amigáveis entre adeptos de clubes "rivais" soam quase sempre a guerrinhas infantis de crianças que brincam aos adultos, que demarcam território de modo quase primal. Talvez seja por isso normal — ou até significativo — que, chegados à idade adulta, reencontremos na afeição por um clube de futebol essa mesma paixão irracional, irrazoável, primitiva, teimosa, obstinada que tínhamos em miúdos...
Confesso: é algo que me passa ao lado.
O que já não me passa ao lado é que o meu pai seja o benfiquista mais contrário que alguma vez vi na vida: a única pessoa que passa a vida a injuriar os jogadores por não jogarem nada, e quando eles finalmente ganham alguma coisa é incapaz de a celebrar, pelo simples facto de que nenhuma das individualidades presentes no Jamor é do Benfica (e, por isso, está obviamente descontente com a vitória) e desejariam ardentemente a derrota do clube. Em vez de se regozijar, irrita-se com o facto do Presidente Sampaio ser do Sporting e estar ali a entregar a Taça.
O meu pai preocupa-se mais com o que os outros acham do que com o que ele sente e com o que ele acha. Ao ponto de cometer as maiores casmurrices só para não "perder a face". O meu pai é um homem orgulhoso que não vê que, aos 75 anos, com um pacemaker no coração, recém-convalescente de uma operação à próstata, já de nada lhe serve ser orgulhoso.
O meu pai é uma criança grande que se recusa a admiti-lo perante si próprio e perante os outros. E isso dói-me.
E nenhuma taça, nenhum jogo, nenhuma vitória tem a mínima importância ao pé disso.
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