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8 de janeiro de 2004

O SANGUE OCULTO

Eduardo Prado Coelho escreve hoje, com alguma deselegância, na sua coluna no Público, que o Quarteto se tornou num "lugar inóspito" - a Cristina, a Marta e o Luís devem estar já a rogar pragas ao eminente comentador - mas vale a pena ousar penetrar nesse lugar inóspito para ver "O Seu Irmão", de Patrice Chéreau (estreia hoje em exclusivo naquela sala; chegará mais tarde ao Porto), um dos mais avassaladores filmes que vi nos últimos anos e, sem margem para dúvidas, um dos melhores que vai estrear cá este ano.

É também um dos filmes mais insuportáveis de se ver que já me passaram à frente - o filme de Chéreau é uma crónica de uma morte anunciada, traçando a reconciliação entre dois irmãos desavindos face à doença terminal de um deles. A doença é mostrada de forma clínica e desapaixonada, como aliás todo o filme, concentrado apenas em perseguir, pelo meio do que se diz e, sobretudo, do que não se diz, o "sangue oculto" que os liga indelevelmente. (A excelente nota do António Rodrigues no Diário de Notícias explica tudo.)

É duro ver "O Seu Irmão"; é uma espécie de catarse que não garante a purificação no fim. É um filme que nos confronta com a vida sem pedir licença, que não escamoteia o feio e o sujo. Mas que o faz sem hipocrisias, com toda a entrega e honestidade de que é capaz. É duro, sim; mas é, também, por isso mesmo, obrigatório. E há algo de apropriado em ser exibido nesse "lugar inóspito" em que o Quarteto se tornou para Eduardo Prado Coelho: é um filme sobre a coragem.

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