Diz hoje Kalaf ao Público, questionado sobre José Afonso, que "ele era comunista, e saiu de moda ser comunista" como se a política fosse uma questão de moda. Não é exactamente assim: durante muitos anos, associou-se em Portugal "ser de esquerda" a "ser comunista", porque, durante o regime de Salazar, os dois conceitos eram sinónimos e o comunismo era a única resistência activa organizada de esquerda à direita no poder. Os tempos exigiam uma divisão preto-no-branco, dicotómica; um pró/contra.
Hoje já não é bem assim, as certezas estilhaçaram-se, há muitas maneiras de se ser de esquerda sem se ser comunista e de se ser de direita sem se ser fascista. Se José Afonso continua preso ao comunismo tal como ele era então entendido, a culpa não será tanto dele como daqueles que, sendo de esquerda, entenderam por bem reivindicá-lo como exclusivamente seu, e sublinharam a dimensão política da sua música.
Com isso, fizeram o pior que se podia ter feito a José Afonso: encerraram-no numa redoma dourada, que reduz a sua música a uma única dimensão, e provavelmente a menos interessante. José Afonso não se esgota - nunca se esgotou - na política que necessariamente enformou o seu trabalho. Mais do que de esquerda, ele era um resistente; e essa resistência partia sempre de uma música que queria abrir novos caminhos para a canção cantada em português, aberta às raízes e às invocações de África, aberta à evolução e à diferença.
A música de José Afonso nunca foi fechada. Nós é que a quisemos sempre fechar numa gaveta. E todas as gavetas são redutoras.
3 comentários:
Que disparate! O Zeca Afonso nunca foi do PC nem de nenhum outro partido de esquerda ou de direita. Quanto muito, "compagnon de route".
upa upa,
salvem o estorninho do afogamento quase certo
e vivam,
as ovas do estorjão
também conhecido como
solha
eu gosto do kalaf é caladinho. já irrita este lobby de todos os projectos decentes ou semi-decentes terem forçosamente uma colaboração do auto-proclamado inventor do kuduru intergaláctico.
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