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14 de dezembro de 2004

POLAROID: METRO

(domingo)

No Rato, o comboio leva mais tempo do que é costume a partir da estação. Chegados ao Marquês de Pombal, o comboio teima em ficar parado no cais. O sinal está verde, com a segunda luzinha vermelha a indicar que não é conveniente partir. O sistema sonoro da estação anuncia, primeiro, que o tráfego na linha amarela se encontra com "perturbações".

Sentada na carruagem, uma mulher loura dorme encostada ao banco, aparentemente a sono solto, de boca aberta. Veste um casaco tipo kispo, fino, calças de ganga, ténis brancos sujos, uma mala que não se distingue por baixo dos braços cruzados. O rosto envelhecido, a figura frágil e macilenta dão a entender alguém que caíu nos braços de um vício. Mexe-se. Curva-se e desfaz e refaz o nó do atacador de um dos ténis. Levanta-se. "Então isto não anda?", pergunta, numa voz arrastada, enrouquecida, para ninguém em especial. Sai da carruagem e pára em frente à porta aberta. Assobia várias vezes, como se o condutor do comboio a pudesse ouvir por entre o ruído de ar condicionado no máximo do motor eléctrico em ponto de embraiagem. Sem resposta, resmunga, volta para dentro, volta a sentar-se, encostando-se à janela com o cotovelo no parapeito.

O sistema sonoro da estação lança uma nova mensagem, diferente da anterior. Saio da carruagem, mas o ruído do motor não me permite fazer sentido do som abafado, roufenho da mensagem. Há pessoas que saem da carruagem e sobem as escadas em direcção à saída. Depois de não conseguir perceber a mensagem uma segunda vez, faço o mesmo; junto às bilheteiras, procuro compreender o que a voz diz — presumo que seja qualquer coisa do género "a circulação na linha amarela está interrompida" — mas não consigo perceber mais do que "pelo facto pedimos as nossas desculpas". Saio da estação e vou a pé até ao Saldanha.

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