Consulta de rotina no médico de família: saio com a habitual prescrição semestral de análise e electrocardiograma e como de costume faço-os logo de manhãzinha, seguidos, no mesmo dia.
No laboratório de análises, observo os gestos perfeitamente automatizados da médica que vai tirar as análises, o modo como pegar numa seringa e numa agulha novas, marcar os tubos e as lamelas onde depois irá guardar a amostra, é encadeado com uma velocidade impensável para quem não domina a técnica. São escassos segundos de preparação até ela introduzir a agulha na pele, nem cinco minutos leva todo o processo. Penso que a médica fará aquilo dezenas de vezes ao dia, centenas à semana. Penso que, se calhar, é tão cansativo e maçador tirar análises o dia inteiro como estar a um computador a introduzir dados ou ao telefone a receber chamadas.
No consultório onde faço os meus electrocardiogramas, há uma nova enfermeira (curiosamente, também de óculos) ao serviço e, ao contrário da anterior, esta mete conversa; vê-me no interior do cotovelo o pequeno algodão preso com um penso rápido que a médica sempre coloca depois das análises, diz-me que "esteve a fazer análises..." e conta-me do seu horror por fazer análises enquanto me passa no peito e nos tornozelos o gel condutor onde vai prender os contactos da máquina. Respondo-lhe que houve uma altura em que era incapaz de ver enquanto me faziam análises. Penso na vez que me pediram uma análise à glicémia (é assim que se diz?), que obriga a duas tiragens de sangue entrecortadas por um pequeno-almoço com um galão com açúcar e um bolo com creme estupidamente doce — dessa vez pedi um duchesse com chantilly, o bolo mais enjoativo que consegui imaginar, e fiz um esforço titânico para o comer todo porque odeio o raio do bolo.
Enquanto ela liga a máquina, quase adormeço nos breves minutos que estou deitado na marquesa de cabedal negro coberta com um qualquer protector de papel translúcido, mas a dolência é interrompida pela enfermeira a perguntar-me se estou a respirar fundo e a pedir-me para respirar normalmente para não afectar o exame.
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