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11 de março de 2004

MAIS TINAIGERES INCONSCIENTES E UMA REFLEXÃO SOBRE A INTOLERÂNCIA

As tias onde costumo almoçar ficam ao pé do Liceu Pedro Nunes. Não é invulgar que bandos de tinaigeres frequentadores de tal estabelecimento invadam a esplanada coberta para tomarem café, almoçarem qualquer coisa pouco saudável e matarem tempo entre aulas. Enquanto tentava ler hoje os jornais do dia frente a um belo arroz de pato, tive de suportar a ideia de humor de um tinaiger inconsciente com ar de beto, misto de surfista anos 80 facção admirador do Bryan Adams e streetwear contemporâneo facção admirador burguês do Eminem: atirar o isqueiro ao chão e pedir aos colegas que iam passando ou aos colegas sentados da mesa do outro lado da coxia para o apanharem, fingindo sempre que o tinha deixado cair, por entre risinhos palermas seus e do colega sentado à sua frente, cúmplice da brincadeira. Evidentemente só eles é que estavam a achar graça.

Apeteceu-me levantar-me calmamente e dar um pontapé no isqueiro para o mandar para longe e acabar com a brincadeira. Entretanto eles cansaram-se. Mas serviu-me para reflectir na minha absoluta intolerância para com qualquer pessoa normal abaixo dos 20 anos de idade convencida de ser a melhor coisa à face da Terra, o que, freudianamente, poderia ser explicado pela minha infância. Até ao 10º ano, passei as passinhas do Algarve às mãos de gente estúpida que se achava superior a mim só por ser mais alta, mais bonita ou mais in, apesar de (ou talvez por?) eu ser bem mais inteligente do que eles.

Mas há sinais exteriores que servem como barreiras: ser gordinho e usar óculos grossos sempre me tornaram num alvo preferencial. Até encontrar um sítio onde se possa pertencer, custa muito ser rejeitado apenas porque - e não há ninguém mais cruel ou mais insensível que uma criança ou um adolescente. Custa ainda mais saber-se que se é apenas tolerado, mas fingir que não se percebe porque não se quer ficar sozinho - e, na adolescência, a importância de pertencer a um grupo é fortíssima. Anos depois, percebem-se as asneiras que se fizeram em nome desse desejo.

Gosto de pensar que hoje não as repetiria; mas nem sempre tenho essa certeza.

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