O que mais me incomoda no governo que temos neste momento não são as evidentes patadas que os seus ministros vão dando (comuns a qualquer ministro de qualquer governo), nem a sensação inescapável de que eles não sabem o que estão a fazer e estão a "navegar à vista" sem saberem muito bem para onde (o que também é verdade de qualquer governo, visto que, para além das célebres duas instruções seladas que qualquer responsável deixa para o seu sucessor, não existe nenhum Manual de Instruções para Governante Moderno).
O que mais me incomoda é a pose de barão que eles têm, como se tivessem nascido para serem ministros, como se fosse a coisa mais natural do mundo. Um exemplo: ontem à noite, num dos noticiários, Figueiredo Lopes, numa cerimónia militar qualquer, falava como se tudo estivesse bem e vivêssemos no melhor dos mundos, como se não tivesse metido argoladas de espécie nenhuma, como se se sentisse confortável na sua pele. Como se estar ali fosse um direito seu de nascença que ninguém lhe pode retirar.
Sinto que a maior parte dos nossos governantes sentem-se confortáveis, talvez até demais, nos cargos que ocupam. E esse à-vontade projecta também uma outra imagem: a de que nós não percebemos nada disto e "eles é que sabem". (O que, aliás, se tem visto abundantemente.) E que é por isso que quem ali está são eles e não nós. (Pois, pois.)
É evidente que, na vida privada, podem ser excelentes pessoas, óptimos pais, maridos, esposas, filhos, mães, e que até no campo profissional que escolheram possam ser altas inteligências. É evidente que aceitar dirigir um país não é exactamente a mesma coisa que gerir um orçamento doméstico. É ainda mais evidente que todos nós erguemos fachadas sociais por uma questão de protecção, sobrevivência, desafio, o que se quiser - ou, como diz um amigo meu, estamos sempre a fazer bluff e a tentar que ninguém perceba que não somos assim tão bons.
O que me preocupa é que essa fechada de segurança, nos nossos governantes, não seja uma fachada. Eu acho que eles acreditam mesmo nisso - e, quando perdemos a capacidade de nos pôr em causa a nós próprios, de nos olharmos com o distanciamento necessário para perceber que também cometemos erros, e (como alguém em tempos disse) nunca nos enganamos e raramente temos dúvidas, está o caldo completamente entornado. Ainda por cima, não há nada de que Portugal mais goste do que de uma boa velha queda em desgraça. E este governo está a habilitar-se violentamente a uma dessas.
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