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23 de dezembro de 2003

LISBOA MENINA E MOÇA

A minha amiga Isabel percebeu que eu andava a namorar o livro de fotografias do Eduardo Gageiro, "Lisboa no Cais da Memória 1957/1974", e decidiu-se a oferecer-mo como prenda de Natal, daquelas que não têm como se retribuir. É uma sumptuosa recolha de instantâneos de uma cidade que já não existe, fotografados com a graça aérea e a urgência intensa de quem sabe que aquele instante não volta mais. E que navega, com uma agilidade impressionante, entre os vários níveis de um país que, já então, andava fora do mundo e atrás do tempo.

Não me recordo desta Lisboa, que já se desvanecia enquanto eu cresci, mas é como se a conhecesse desde sempre, fixada nas memórias que leituras e visões se foram encarregando de me construir. E Gageiro fotografa-a em tudo o que ela tem de mítico e de mesquinho, de terno e de brutal. Esta Lisboa que já não existe em corpo continua presente em espírito em cada um de nós, e neste livro reconhecemos algo de tão nosso como o código genético, uma espécie de atavismo local passado de geração em geração.

É a mais bela e a mais terrível das Lisboas que aqui se vê, registada com o amor que só quem muito a ama lhe consegue ter. E registando na transiente eternidade do papel fotográfico, mesmo a preto e branco, a luz mediterrânica e telúrica que em mais lado nenhum do mundo existe.

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