roda livre
Blog-notas de ideias soltas; post-it público de observações casuais; fragmentos em roda livre, fixados em âmbar. Eu, sem filtro. jorge.mourinha@gmail.com
Pesquisa personalizada
29 de outubro de 2012
o galãozinho
Há uma cigana (idosa, cabelos brancos, sempre sozinha) que mora na minha zona e que já me habituei a ver um pouco por todo o lado. Nos correios, onde vai perguntar se já chegou não sei o quê (talvez a pensão); no supermercado, onde vai comprar os básicos; e, sobretudo, nos semáforos ou nos cafés, a pedir às pessoas se "não lhe pagam um galãozinho". Na véspera, eu tinha-a visto a pedir junto de um carro estacionado para deixar entrar passageiros; só lhe faltou entrar para dentro do carro a pedir. O dono do café, hoje, interpela-a quando a vê perguntar aos clientes, pela segunda vez no dia, se "não lhe pagam um galãozinho": "Mas então não tomou já hoje o pequeno-almoço?" E ela responde-lhe "É para aquecer que hoje está frio." O dono do café abana a cabeça.
3 de setembro de 2012
chamem a polícia
Por razões que não tenho bem a certeza de entender, todos os agentes da polícia com quem me cruzo hoje estão ao telefone.
3 de agosto de 2012
a fila
Na fila para comprar o jornal, uma senhora velhota pergunta se precisa de ir para a fila para pagar a revista Telenovelas porque já lá tinha estado antes. O caixa diz que tem de ir para a fila a não ser que as pessoas à minha frente a deixassem pagar primeiro - e as pessoas à minha frente, que são um casal velhote, deixam. Isto apesar de eu também só querer comprar um jornal e de ter ido para a fila na mesma. É daquelas coisas que me leva a questionar exactamente qual é a noção de "civismo" dos portugueses.
30 de julho de 2012
eu sou uma mulher muito ocupada
A senhora está de pé na recepção do centro de saúde, com aquele ar enfadado de quem tem muito que fazer à segunda de manhã e não está para estar ali a perder tempo desnecessariamente, consultando o telemóvel todos os dez segundos e afivelando o ar de "eu sou uma pessoa importante e não estou para ficar aqui à espera". Assim que a senhora que está a ser atendida termina, dirige-se à funcionária administrativa com o mal-disfarçado desdém de quem não está para isto, atira com a sua senha para a mesa e diz-lhe, de alto e sem sequer se sentar, "olhe, eu estou aqui à espera só porque preciso de uma justificação para o emprego". Ao longo dos cinco minutos seguintes, chega ao ponto de dizer à funcionária o que ela deve escrever no justificativo, agastada por a sua médica ter faltado. "É a segunda vez num mês, e ela falta sempre à segunda-feira. Eu também gosto de fins-de-semana prolongados mas tenho de trabalhar à segunda-feira." A funcionária pergunta-lhe: "9 e 25?" "9 e 25 o quê?" "São 9 e 25." "Ponha 9 e 30, que são os cinco minutos que eu levo a chegar lá acima. E escreva que não fui atendida por falta da médica, senão ainda acham que eu não tinha consulta nenhuma."
18 de julho de 2012
não há ninguém capaz de me dar alergia
A senhora sentada ao balcão da cafetaria do Corte Inglés não se cala: diz ao homem com quem está e a quem a quiser ouvir que a comida ali é toda uma porcaria e não há um prato de jeito e o atendimento é muito demorado. Dou por mim com vontade de lhe dizer: se não gosta porque é que não vai comer a outro lado?
3 de julho de 2012
745 (entre o filme e o médico)
Um homem andrajoso e sujo entra no autocarro e dirige-se para os lugares das traseiras; atrás de si deixa o odor característico de quem não se lava há muito tempo. Algumas paragens mais à frente, entram os revisores da Carris para verificar os bilhetes. Quando o revisor chega ao homem andrajoso e sujo, este responde "não tenho passe nem tenho bilhete nem tenho dinheiro". O revisor grita para o condutor abrir a porta e o senhor, depois de repetir "não tenho passe nem tenho bilhete nem tenho dinheiro", sai do autocarro. Uma senhora ouve-se a dizer "se fosse eu ele ou não tinha entrado ou pagava a multa como as outras pessoas".
28 de junho de 2012
de bestiais a bestas (ou a ressaca do ludopédio)
Ouvido no café ao pequeno-almoço depois da derrota com a Espanha: "Dou mais cinco anos ao Cristiano Ronaldo. Sem ele, o que é que Portugal tem? Nada. O Bruno Alves é atrasado mental. Aquele Postiga? Não joga nada, está no Saragoça não joga no Saragoça, o Sporting não o quis, não joga nada. Portugal deu um baile à Espanha? Portugal não jogou nada, quantos espanhóis jogaram à sua altura habitual? Dois."
22 de junho de 2012
713 (ar condicionado)
Porque é que as pessoas vêem sempre nas janelas dos autocarros a indicação "ar condicionado. Por favor manter a janela fechada" e apesar disso abrem sempre a janela?
21 de junho de 2012
a fúria do açúcar
No café do Classic Alvalade, enquanto espero por uma projecção, um sem-abrigo (sujo, determinado, mal vestido) entra pelo café dentro e dirige-se à minha mesa. Penso que me vai pedir esmola ou que lhe pague um café. Em vez disso, diz-me "posso?" e dirige a mão para o meu queque. Digo-lhe que não. Agarra então na chávena de café praticamente vazia e, enquanto pergunta de novo "posso?", perante o meu ar atónito (e das empregadas do café) antes que eu possa dizer que "não", bebe o resto do café, pousa a chávena e lança-me quase ofendido "não tem açúcar!".
Enquanto as empregadas tentam desesperadamente correr com o homem, ele faz exactamente o mesmo com outras mesas antes que o projeccionista consiga finalmente pô-lo fora. Perguntam-se se será um fugido do Júlio de Matos.
Enquanto as empregadas tentam desesperadamente correr com o homem, ele faz exactamente o mesmo com outras mesas antes que o projeccionista consiga finalmente pô-lo fora. Perguntam-se se será um fugido do Júlio de Matos.
20 de junho de 2012
727 (a voz do povo)
Diz a moça encostada à porta do autocarro vestida de modo espalhafatoso e com voz rouca, saltos altos e cabelo louro, para o senhor velhote que se prepara para sair: "O senhor saia lá e não caia, em vez de estar a olhar para onde não deve..."
Subscrever:
Mensagens (Atom)