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11 de abril de 2004

POLAROID DOMINGO DE PÁSCOA

Lisboa deserta, como se toda a gente tivesse ido para fora (e, de certo modo, até foi). As largas avenidas estão vazias, de gente, de trânsito, sob um sol frio de Primavera ventosa, céu azul entrecortado de nuvens largas de algodão. Lojas, cafés, restaurantes, fechados, ajudam à sensação de intervalo, de pausa na lufa-lufa quotidiana. Os poucos que estão abertos têm pouca gente, respiram a calmaria que tantas vezes sonhamos para os fins-de-semana de bom tempo mas que quase nunca se concretizam.

Largo do Rato: o sem-abrigo que costuma estar a pedir esmola à entrada do metro, junto à esquadra, está de calções e pernas nuas, tisnadas, a ler com atenção os ingredientes num pacote de cereais de pequeno-almoço.

Avenida Praia da Vitória: uma das empregadas do restaurante chinês recebe uma cliente habitual, senhora idosa vestida de preto, óculos escuros e uma permanente grisalha, acompanhada pelo esposo, com dois beijos na face, à ocidental. Uma outra empregada, chinesa, fala português fluente, sem o sotaque habitual. Na televisão que está ligada no noticiário, uma peça sobre "acupunctura" surge identificada como "acumpunctura".

Largo do Carmo: dois jovens GNR reluzentes em farda de gala, na frontaria do quartel coberta de rede e andaimes devido a obras, comparam o lustro das botas altas de montar e das esporas, batem com os calcanhares num ruído de parada.

Fnac do Chiado: um senhor pega na banda-sonora das "Triplettes de Belleville" ao mesmo tempo que eu me inclino sobre o escaparate; pede-me desculpa e afasta-se para eu ver, eu afasto-me por seu lado para ele pegar no disco. À saída, uma das caixas, com pouco trabalho, pega no jornal para ler o horóscopo do dia.

Picoas Plaza: um casal compara os gelados que foi comprar isoladamente, prova os sabores um do outro, ela de longos cabelos escuros e voz determinada, ele de sapatos de vela, blusão desportivo e óculos escuros na testa.

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